THOMAS ICE
O moderno
dispensacionalismo sistemático chega à casa dos duzentos anos de expressão e
desenvolvimento. [NOTA-1 DE HÉLIO: o reconhecimento de que devemos distinguir
diferenças entre conteúdo, vigência e a quem se aplicam as várias promessas e
condições da Bíblia sempre existiu desde 2Tm 2:15. Ice refere-se apenas à
sistematização recente deste antigo reconhecimento, que recebeu o nome de
dispensacionalismo]. Vivemos um momento em que o dispensacionalismo e alguns de seus
conceitos têm sido propagados e adotados por grupos de diferentes tradições
religiosas. Isso não [sic] é surpresa, pois nossa época se caracteriza pela
anti-sistematização e pelo ecletismo na área do pensamento. Talvez a grande
surpresa para alguns seja o fato de que o dispensacionalismo se desenvolveu e
difundiu, durante os seus primeiros 100 anos, entre aqueles que se mantiveram
na tradição calvinista reformada. Somente de 75 a 50 anos para cá é que o
dispensacionalismo e algumas de suas convicções se propagaram, de modo
significativo, fora da órbita do calvinismo.
Definições
Antes de prosseguirmos, preciso estabelecer definições
funcionais do que quero dizer com calvinismo e dispensacionalismo. Em primeiro
lugar, ao mencionar calvinismo me refiro, principalmente, ao sistema teológico
relacionado à doutrina da graça ou calvinismo soteriológico. Incluem-se nessa
categoria o calvinismo estrito e o modificado (i.e, o calvinismo de cinco
pontos e o de quatro pontos, respectivamente). Refiro-me àquele aspecto do
calvinismo que trata da natureza decaída do ser humano e da graça eletiva de
Deus.
Em segundo lugar, ao mencionar dispensacionalismo, faço alusão
ao sistema teológico desenvolvido por J. N. Darby [vide
Nota-1 de Hélio, acima] que deu origem à sua moderna ênfase na
interpretação literal coerente; na distinção entre o plano de
Deus para Israel e o Seu plano para a Igreja; normalmente, no Arrebatamento
pré-tribulacional da Igreja antes da septuagésima semana de Daniel; no
pré-milenismo; e na multiforme proeminência da glória de Deus como o propósito
final da história. Nisso se incluem alguns que, tendo adotado tal sistema [o
dispensacionalismo], talvez parem, de repente, de crer no pré-tribulacionismo. O
foco da atenção deste artigo é o pré-milenismo dispensacionalista.
A lógica teológica
Em concordância com o ímpeto calvinista de olhar
teocentricamente a história, creio que o pré-milenismo dispensacional propõe o
mais lógico final escatológico dos decretos soberanos de Deus quanto à salvação
e à história. Visto que os pré-milenistas dispensacionais consideram as
promessas divinas, tanto a da eleição de Israel quanto a da eleição da Igreja,
como incondicionais e certas no seu futuro cumprimento, tal convicção é lógica
e coerente com a Bíblia. Um teólogo aliancista diria que a eleição de Israel
era condicional e temporária. Muitos calvinistas são teólogos aliancistas que
acreditam na incondicionalidade e irrevogabilidade da eleição dentro da Igreja.
Estes entendem que o plano divino para Israel está condicionado à escolha
humana, ao passo que o plano de Deus para a salvação no âmbito da Igreja é, em
última análise, um ato soberano dEle. Não há simetria em tal lógica. Enquanto
isso, os pré-milenistas dispensacionais entendem ambos os atos como uma
expressão soberana do plano divino na história, que vem a ser uma aplicação
coerentemente lógica da vontade soberana de Deus nas questões humanas.
Samuel H. Kellogg, pastor, missionário e educador presbiteriano,
escreveu sobre a lógica entre o calvinismo e o “pré-milenismo futurista
moderno”, que em sua época (1888) era essencialmente dispensacional. “Porém, em
geral”, comenta Kellogg, “pode-se dizer acertadamente que as relações lógicas
do pré-milenismo o aproximam mais intimamente do sistema agostiniano do que
de qualquer outro sistema teológico”. [1] Sua utilização do termo “agostiniano”
é uma nomenclatura mais antiga para o termo “calvinista”. Kellog salienta as
diversas áreas nas quais o calvinismo e o pré-milenismo são teologicamente
unânimes. “O pré-milenismo pressupõe uma antropologia fundamentalmente agost
iniana. O calvinismo comum declara a completa impotência do indivíduo quanto à
sua auto-regeneração e auto-redenção”. [2] Ele prossegue: “é evidente que as
pressuposições antropológicas, nas quais o pré-milenismo parece se basear,
devem trazer consigo uma soteriologia semelhante”. [3] Kellogg
fundamenta que “a afinidade agostiniana da escatologia pré-milenista fica mais
evidente. Não há nada mais acentuado do que a constante insistência dos
pré-milenistas de que [...] a atual dispensação é estritamente eletiva”.4 “Em
suma”, conclui Kellogg, “podemos dizer que aquilo que os pré-milenistas
simplesmente afirmam ser o macrocosmo, os agostinianos em geral declaram ser o
microcosmo”. [5]
Isso não quer dizer que dispensacionalismo e calvinismo são
sinônimos. Eu simplesmente argumento que o dispensacionalismo é compatível com
certos elementos do calvinismo, o que proporciona uma resposta parcial para a
questão do dispensacionalismo ter se originado do útero reformado. C. Norman
afirma:
Há, por certo, importantes elementos calvinistas do século XVII
no dispensacionalismo moderno, mas estes elementos foram combinados com ênfases
doutrinárias provenientes de outras fontes, a fim de formar um sistema
diferente que, em muitos aspectos, é completamente estranho ao calvinismo
clássico. [6]
Apesar disso, o dispensacionalismo de fato se desenvolveu dentro
da comunidade reformada e, durante seus primeiros 100 anos, a maioria dos adeptos
vinha de um ambiente calvinista. Kraus chega à seguinte conclusão: “Levando
tudo isso em conta, ainda é preciso assinalar-se que as afinidades teológicas
básicas do dispensacionalismo são calvinistas. A esmagadora maioria de homens
envolvidos nos movimentos de conferências bíblicas e proféticas endossava
declarações de fé calvinistas”. [7]
Darby e o
Movimento dos Irmãos
O dispensacionalismo sistemático moderno desenvolveu-se nos idos
de 1830 por J. N. Darby [vide Nota-1 de Hélio, acima] e
aqueles que faziam parte do Movimento dos Irmãos. Praticamente todos esses
homens procediam de igrejas cuja soteriologia era calvinista. “Em se tratando
de teologia”, relata H. H. Rowdon, historiador do Movimento dos Irmãos, “os
primeiros Irmãos eram unanimemente calvinistas”. [8] Isso ecoa nas palavras de
um dos fundadores dos Irmãos, J. G. Bellet, que começava sua associação com o
movimento, quando seu irmão, George, escrevendo a seu respeito, disse: “pois
suas convicções decididamente se tornaram mais calvinistas, e acredito que
todos os amigos com quem se associara em Dublin, sem exceção, eram desta
posição”. [9]
Qual era a posição de Darby nessa questão? John Goddard comenta
que Darby “cria na predestinação de indivíduos e rejeitava o esquema arminiano
de que Deus não predestinou aqueles que de antemão sabia que se conformariam à
imagem de Cristo”. [10] Em sua “Letter on Free-Will” (i.e., “Carta Sobre o
Livre-Arbítrio”), Darby deixa claro que rejeita esse conceito. “Se Cristo veio
salvar o perdido, o livre-arbítrio não tem mais razão de ser”. [11] “Creio que
devamos nos apegar à palavra”, prossegue Darby, “mas, filosófica e moralmente
falando, o livre-arbítrio é uma teoria falsa e absurda. Livre-arbítrio é um
estado de pecado”. [12] Em virtude de crer na escravidão do pecado, Darby,
logicamente, manteve sua crença na graça soberana como condição para a
salvação:
O desdobramento desse princípio da graça soberana é tal que sem
ele ninguém seria salvo, pois não há quem entenda, não há quem busque a Deus, nenhuma
pessoa que, por seus próprios esforços, consiga um dia ter vida. O julgamento
baseia-se nas obras; a salvação e a glória são fruto da graça”. [13]
Outra evidência do calvinismo de Darby é que ele, pelo menos em
duas ocasiões, foi convidado por calvinistas não-dispensacionalistas para
representá-los na defesa do calvinismo. Um dos biógrafos de Darby, W. G.
Turner, registrou a sua defesa no debate ocorrido na Universidade de Oxford:
Foi numa data mais remota (acredito que em 1831) que F. W.
Newman convidou o Sr. Darby para ir a Oxford: um momento memorável por sua
refutação pública dos argumentos levantados pelo Dr. E. Burton que rejeitavam
as doutrinas da graça defendidas pelos reformadores e sustentadas não somente
por Bucer, P. Mártir e pelo bispo Jewell, mas também pelos artigos IX-XVIII da
Igreja Anglicana. [14]
Noutra ocasião, Darby foi convidado para ir à cidade de Calvino,
Genebra, na Suíça, a fim de fazer uma defesa do calvinismo. Turner declara que
“ele refutou o ‘perfeccionismo’ de John Wesley, para alegria da Igreja Livre da
Suíça”. [15] Darby foi condecorado pelos líderes de Genebra com a medalha de
honra ao mérito. [16]
E ainda, quando algumas doutrinas reformadas foram criticadas
dentro da igreja a que outrora servira, “Darby assinalou sua aprovação do
artigo XVII”, que trata da eleição e predestinação, “incluso nos trinta e nove
artigos da declaração doutrinária da Igreja Anglicana”. [17] Darby afirmou:
De minha parte, em sã consciência, reputo como sábio o artigo
XVII. Talvez possa dizer que se trata da mais sábia e condensada declaração
humana, que eu conheça, sobre o conteúdo em questão. Estou plenamente
satisfeito em interpretá-lo em seu sentido literal e gramatical. Creio que a
predestinação para a vida é o propósito eterno de Deus, por meio do qual, antes
que os fundamentos do mundo fossem estabelecidos, Ele decretou firmemente
salvar dentre a raça humana aqueles que escolhera em Cristo, pelo Seu conselho
que nos é secreto, e apresentá-los, por intermédio de Cristo, como
vasos de honra, para a eterna salvação. [18]
Scofield, Chafer e
o Seminário Teológico de Dallas
C. I. Scofield (1843-1921), Lewis Sperry Chafer (1871-1952) e o
Seminário Teológico de Dallas (fundado em 1924) foram importantes veículos na
propagação do dispensacionalismo nos Estados Unidos e no mundo. Tanto Scofield
quanto Chafer eram pastores ordenados pela Igreja Presbiteriana. A Bíblia
de Scofield com Referências é considerada por muitos como a ferramenta
mais eficaz na disseminação do dispensacionalismo nos Estados Unidos. [19]
Scofield se converteu a Cristo na meia-idade e, primeiramente, foi discipulado
por James H. Brookes em Saint Louis. Foi ordenado ao ministério da Primeira
Igreja Congregacional de Dallas em 1882 e transferiu suas credenciais
ministeriais para a Igreja Presbiteriana dos Estados Unidos em 1908. [20]
Conseqüentemente, seu ministério se desenvolveu num contexto calvinista.
Scofield foi a maior influência no desenvolvimento teológico de
Chafer. John Hannah menciona que “é impossível entender Chafer sem que se
perceba a profunda influência de Scofield”. [21] Na realidade, “Chafer sempre
comparava esse relacionamento ao de pai e filho”. [22] Tal relacionamento
originou-se do aprendizado de Chafer sob a tutela de Scofield na Conferência de
Northfield e da transformação de vida incentivada pelos estudos de Scofield à
frente da Primeira Igreja Congregacional de Dallas nos primórdios de 1900.
Scofield disse a Chafer que seus dons relacionavam-se mais com a área de ensino
do que com a de evangelismo na qual este tinha atuado. Em seguida, “os dois
oraram juntos e Chafer dedicou a sua vida inteira ao estudo e ao ensino da
Bíblia”. [23]
Scofield e Chafer foram dois dos maiores dispensacionalistas
americanos e ambos desenvolveram sua teologia a partir de um contexto
reformado. Scofield é conhecido por sua Bíblia de Estudo e Chafer pela
publicação de sua Teologia Sistemática e pelo Seminário Teológico de Dallas.
Jeffrey Richards descreve as características teológicas de Chafer mencionando
que “têm muito em comum com toda a tradição reformada. Com exceção da
escatologia, Chafer é teologicamente parecido com os expoentes da teologia de
Princeton, tais como Warfield, Hodge e Machen. Reconhecia, de modo semelhante,
doutrinas como, por exemplo, a soberania de Deus [...] a depravação total da
humanidade, a eleição, a graça irresistível e a perseverança dos santos”. [24]
C. Fred Lincoln descreve a obra de Chafer intitulada Systematic
Theology (Teologia Sistemática – publicada em português pela Editora
Hagnos. N.T.), como “completa, calvinista, pré-milenista e dispensacionalista”.
[25]
Desde a sua fundação em 1924 com o nome The Evangelical
Theological College (mudado em 1936 para Dallas Theological
Seminary), o Seminário de Dallas causou um impacto de proporções globais a
favor do dispensacionalismo. Seu principal fundador foi Chafer. Entretanto,
William Pettingil e W. H. Griffith-Thomas também desempenharam um papel
importante na sua fundação. Pettingil, à semelhança de Chafer, era
presbiteriano. Griffith-Thomas, um anglicano, escreveu um dos melhores
comentários sobre Os Trinta e Nove Artigos (de Fé) da Igreja Anglicana, [26]
que até hoje são largamente utilizados por anglicanos e episcopais
conservadores. Os Trinta e Nove Artigos são fortemente calvinistas. Esses dois
homens eram claramente calvinistas. O Seminário de Dallas, especialmente antes
da Segunda Guerra Mundial, se considerava calvinista. Certa feita, num folheto
de propaganda, Chafer caracterizou a escola como “plenamente de acordo com a fé
reformada e sua teologia é estritamente calvinista”. [27] Numa carta escrita a
Allan MacRae, do Seminário Teológico de Westminster, Chafer declarou: “Você
provavelmente sabe que somos calvinistas declarados em nossa teologia”. [28]
“Em 1925, quando se referia ao corpo docente do Seminário, Chafer fez uma
observação de que quase todos eram procedentes de igrejas presbiterianas das
regiões Sul e Norte do país”. [29] Além disso, escrevendo a um pastor
presbiteriano, Chafer afirmou: “Eu me alegro em afirmar que não existe instituição,
que eu saiba, mais calvinista como um todo, nem mais ajustada, por inteiro, a
esse sistema de doutrina, defendido pela Igreja Presbiteriana”. [30]
Visto que muitos dos primeiros formandos de Dallas ingressaram
no ministério presbiteriano, iniciou-se uma reação ao seu pré-milenismo
dispensacionalista nos idos de 1930. Não era uma questão de serem ou não
calvinistas na sua soteriologia, mas uma questão referente à sua escatologia.
No final da década de 1930, “o Seminário Teológico de Dallas, embora
professasse firmemente ser uma instituição presbiteriana, foi deixado fora do
movimento conservador presbiteriano dissidente”. [31] Em 1944, os
presbiterianos do Sul dos EUA emitiram o relatório de um comitê de investigação
da compatibilidade do dispensacionalismo com a Confissão de Fé de
Westminster. O comitê decretou que o dispensaciona lismo não se harmonizava
com a confissão de fé da igreja. Esse “relatório de 1944 foi o golpe que acabou
com todas as expectativas futuras do pré-milenismo dispensacionalista dentro do
presbiterianismo do Sul do país”. [32] Essa deliberação fez com que muitos
ex-alunos do Seminário de Dallas deixassem seus ministérios em denominações de
fé reformada e ingressassem no movimento de Igrejas Bíblicas independentes.
Um aumento na
aceitação do dispensacionalismo
Ainda que o dispensacionalismo tenha tido, já na década de 1880,
uma modesta penetração entre os batistas, através de representantes como, por
exemplo, J. R. Graves, [Nota2 de Hélio: Graves foi bom numas coisas e mau noutras, por
exemplo exaltando tanto o batismo por submersão que chegou próximo de
considerá-lo indispensável para salvação] [33] um
calvinista convicto, estes foram repelidos pelos não-calvinistas até meados da
década de 1920, quando elementos da teologia dispensacionalista começaram a ser
adotados por alguns pentecostais numa tentativa de rebater a crescente ameaça
do liberalismo. Kraus explica:
Alguns professores declararam explicitamente que o pré-milenismo
era um escudo de defesa contra a teologia racionalista. Assim, não é de se
admirar a descoberta de que rudimentos teológicos normativos do
dispensacionalismo tenham concorrido diretamente contra a ênfase da “Nova
Teologia” em desenvolvimento. [34]
Até esse ponto na história, aqueles que eram de tradição
arminiana e wesleyana estavam mais interessados nas questões relativas à
santificação pessoal no presente, do que à atenção calvinista em explicar a
obra soberana de Deus no decurso da história. Contudo, o surgimento da
controvérsia fundamentalista-liberal na década de 1920 despertou um interesse
pela defesa da Bíblia contra os ataques anti-sobrenaturalistas dos críticos
liberais, que ultrapassava o âmbito do calvinismo. O dispensacionalismo foi
visto como uma resposta bíblica e conservadora ao liberalismo, não apenas no
meio fundamentalista, mas também, e cada vez mais, entre os pentecostais e
outros grupos. Timothy Weber faz a seguinte observação:
Em tempo, o dispensacionalismo também teve seus adeptos dentro da
tradição wesleyana. Outros grupos radicais da denominação Holiness repercutiram
as predições dispensacionalistas de declínio da ortodoxia e da consagração nas
igrejas; e os pentecostais descobriram no dispensacionalismo uma ocasião para o
derramamento do Espírito num dia de “chuva serôdia” antes da Segunda Vinda.
[35]
O desenvolvimento
do dispensacionalismo no pós-guerra
Os movimentos fundamentalista/evangélico e
pentecostal/carismático se alastraram rapidamente pelos Estados Unidos depois
da Segunda Guerra Mundial e o dispensacionalismo, por estar relacionado com
tais movimentos, também cresceu rapidamente. Muitas pessoas nascidas durante o
“baby-boom” do pós-guerra cresceram no ambiente de igrejas pentecostais e
carismáticas tendo o dispensacionalismo e o Arrebatamento pré-tribulacional
como parte de sua estrutura doutrinária. Portanto, nem lhes passava pela cabeça
que o dispensacionalismo não era inerente às características específicas de sua
teologia da restauração. Além disso, quando o fundamentalismo não-calvinista se
expandiu depois da Segunda Guerra, especialmente nos círculos batistas
independentes, houve uma ruptura ainda maior dos distintivos
dispensacionalistas em relação às suas raízes calvinistas.
De outro lado, o expurgo do dispensacionalismo por parte do
cristianismo reformado, iniciado no final da década de 1930, foi plenamente
concluído. Um exemplo típico dessa polarização verifica-se em livros como Wrongly
Dividing The Word Of Truth: A Critique of Dispensationalism (“Manejando
Mal a Palavra da Verdade: Uma Crítica ao Dispensacionalismo”) de John Gerstner.
[36] Enquanto, por um lado, admite que “o estranho no dispensacionalismo é que
parece ter tido seus mais fortes defensores em igrejas calvinistas”, [37]
Gerstner se opõe tão fortemente ao dispensacionalismo que se tornou cego para
perceber a verdadeira natureza calvinista de tal teologia teocêntrica. Gerstner
alega que ele e outros teólogos reformados levantaram “um forte questionamento
sobre o dispensacionalismo e suas reivindicações calvinistas”. [38] Parece que
pelo fato de o dispensacionalismo ter se originado numa tradição reformada,
como um rival da teologia aliancista, alguns querem dizer que não pode
logicamente ser calvinista. Esse é o argumento de Gerstner. Entretanto, apesar
do seu sofisma [uma mentira propositalmente maquiada por argumentos e premissas
que têm toda aparência de verdadeiros, mas que são falsos] nessa
questão, [39] Gerstner não pode anular o fato histórico de que o
dispensacionalismo foi gerado em meio à mentalidade bíblica de uma teologia
nitidamente teocêntrica, por aqueles que defendiam firmemente o calvinismo
soteriológico. A provável razão pela qual a comunidade reformada tomou a
dianteira na crítica da teologia dispensacionalista se encontra no fato de que o
dispensacionalismo nasceu num contexto reformado.
Conclusão
É justamente pelo fato de que o dispensacionalismo penetrou em
quase todas as formas de protestantismo, que muitos, hoje em dia, talvez fiquem
surpresos em conhecerem de onde procede a sua herança. Em nossos dias de
irracionalismo pós-moderno em que a virtude se constitui em NÃO verificar a
coerência dos pontos da teologia de uma pessoa, precisamos nos lembrar que a
teologia da Bíblia é uma peça de roupa elaborada sem costura. Tudo se sustenta
em conjunto. Se alguém começa a repuxar ou esgarçar um único fio de linha, o
tecido todo corre o risco de se desmanchar.
O dispensacionalismo é mais bem entendido como um sistema
teológico que compreende Deus como o Soberano Governante dos céus e da terra; o
homem como um vice-regente rebelde (junto com alguns anjos); Jesus Cristo como
o Herói da história que salva algumas pessoas por Sua Graça; a história como
uma lição na concretização da glória de Deus exibida tanto no céu quanto na
terra. O dispensacionalismo é uma teologia que, segundo creio, procede
exatamente do estudo bíblico e que reconhece Deus como Deus. (Thomas
Ice - http://www.chamada.com.br)
Notas:
1. Samuel
H. Kellog, “Premillennialism: Its relations to Doctrine and Practice”,
publicado em Bibliotheca Sacra, V. XLV, 1888, p. 253.
2. Kellogg,
“Premillennialism”, p. 254.
3. Kellogg,
“Premillennialism”, p. 257.
4. Kellogg,
“Premillennialism”, pp. 258-9.
5. Kellogg,
“Premillennialism”, p. 256.
6. C.
Norman Kraus, Dispensationalism in América: Its Rise and Development,
Richmond: John Knox Press, 1958, p. 59.
7. Kraus, Dispensationalism,
p. 59.
8. Harold
H. Rowdon, Who are the Brethren and Does it Matter? Exeter,
England: The Paternoster Press, 1986, p. 35.
9. George
Bellet, Memoir of the Rev. George Bellet, Londres: J. Masters,
1989, p. 41-2, citado em John Nelson Darby de Max S.
Weremchuk, Neptune, NJ: Loizeaux Brothers, 1992, p. 237, f. n. 25.
10. John
Howard Goddard, “The Contribution of John Nelson Darby to Soteriology,
Eclesiology, and Eschatology” (Dissertação de doutorado no Dallas Theological
Seminary, 1948), p. 85.
11. J. N.
Darby, “Letter on Free-Will”, publicado em The Collected Writings of J.
N. Darby, Winschoten, Holanda: H. L. Heijkoop, 1971, V. 10, p. 185.
12. Ibid.,
p. 186.
13. J. N.
Darby, “Notes on Romans”, publicado em The Collected Writings of J. N.
Darby, Winschoten, Holanda: H. L. Heijkoop, 1971, V. 26, pp. 107-8.
14. W. G.
Turner, John Nelson Darby: A Biography, Londres: C. A. Hammond,
1926, p. 45.
15. Ibid.,
p. 58.
16. Rowdon, Who
Are The Brethren, pp. 205-7.
17. Goddard,
“The Contribution of Darby”, p. 86.
18. J. N.
Darby, “The Doctrine of the Church of England at the Time of the Reformation”,
publicado em The Collected Wrintings of J. N. Darby, Winschoten,
Holanda: H. L. Heijkoop, 1971, V. 3, p. 3 (A expressão em itálico é original).
19. Larry
V. Crutchfield, The Origens of Dispensationalism: The Darby Factor,
Lanham, MD: University Press of America, 1992, Prefácio.
20. Dictionary
of Christianity in America, organizado por Daniel Reid,
Downers Grove, IL: InterVarsity Pres s, 1990, pp. 1057-8.
21. John
David Hannah, “The Social and Intellectual History of the Origins of the
Evangelical Theological College” (Dissertação de doutorado na Universidade do
Texas em Dallas, 1988, pp. 118-9.
22. Jeffrey
J. Richards, The Promise of Dawn: The Eschatology of Lewis Sperry
Chafer, Lanham, MD: University Press of America, 1991, p.
23. Ibid.
24. Ibid.,
p. 3.
25. C. F.
Lincoln, “Biographical Sketch of the Author”, publicado em Systematic
Theology de Lewis Sperry Chafer, Dallas: Dallas Seminary Press, 1948,
V. VIII, p. 6.
26. W. H.
Griffith Thomas, The Principles of Theology: An Introduction to the
Thirty-nine Articles, Grand Rapids: Baker Book House, 1979 [1930].
27. Citado em “Origins of the Evangelical
Theological College”, de Hannah, p. 199-200.
28. Citado em Ibid., p. 200.
29. Citado em Ibid., p. 346.
30. Citado em Ibid., p. 346, f. n. 323.
31. Ibid.,
pp. 357-8.
32. Ibid.,
p. 364.
33. Veja
em The Work of Christ Consummated in 7 Dispensations, de J. R.
Graves, Memphis: Baptist Book House, 1883.
34. Kraus, Dispensationalism,
p. 61
35. Weber,
“Premillennialism”, p. 15.
36. John H.
Gerstner, Wrongly Dividing the Word of Truth: A Critique of
Dispensationalism, Brentwood, TN: Wolgemuth & Hyatt Publishers, 1991.
37. Ibid.,
p. 106.
38. Ibid.
39. Ibid.,
pp. 105-47.
Thomas Ice é diretor-executivo do Pre-Trib Research Center (Centro de Pesquisas Pré-Tribulacionistas) e professor de Teologia na Liberty University. Ele é Th.M. pelo Seminário Teológico de Dallas e Ph.D. pelo Seminário Teológico Tyndale. Editor da Bíblia de Estudo Profética e autor de aproximadamente 30 livros, Thomas Ice é também um renomado conferencista. Ele e sua esposa Janice vivem com os três filhos em Lynchburg, Virginia (EUA). |
Extraído do livro Entendendo o Dispensacionalismo
Quem tem uma perspectiva divina do passado,
do presente e do futuro é capaz de saber o que Deus espera dele em todos os
aspectos da vida.
Todas as citações
bíblicas são da ACF (Almeida Corrigida Fiel, da SBTB). As ACF e ARC (ARC
idealmente até 1894, no máximo até a edição IBB-1948, não a SBB-1995) são as
únicas Bíblias impressas que o crente deve usar, pois são boas herdeiras da
Bíblia da Reforma (Almeida 1681/1753), fielmente traduzida somente da Palavra
de Deus infalivelmente preservada (e finalmente impressa, na Reforma, como o
Textus Receptus).
(Copie e distribua ampla mas gratuitamente, mantendo o nome do autor e pondo
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(retorne
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retorne a http:// solascriptura-tt.org/ )
Somente use Bíblias traduzidas do Texto Tradicional (aquele perfeitamente preservado por Deus em ininterrupto uso por fieis): BKJ-1611 ou LTT (Bíblia Literal do Texto Tradicional, com notas para estudo) na bvloja.com.br. Ou ACF, da SBTB.