(copiado de http://www.beth-shalom.com.br/artigos/preterismo.html)
Há algum tempo ministrei um curso sobre Escatologia (profecia bíblica) no
Chafer Theological Seminary (Seminário Teológico Chafer, na cidade de Orange,
California/EUA). Como o preterista* Ken Gentry mora perto do Seminário Chafer,
eu o convidei a vir para falar à classe. Apesar do Seminário Chafer ser uma
escola dispensacionalista, achei que seria saudável expor os alunos a uma
posição oposta aos nossos pontos de vista, através da visita do Dr. Gentry. O
Dr. Gentry foi bastante cortês em vir e nos dar uma apresentação de sua visão
preterista do livro de Apocalipse.
Durante um tempo de perguntas, indaguei-lhe sobre a relação entre Zacarias 12-14 e o preterismo. Primeiro lhe perguntei se, como preterista, ele acreditava que Zacarias 12-14 era uma passagem paralela ao “Sermão Profético” de Jesus (Mt 24-25; Mc 13; Lc 21.5-36). Ele disse que concordava. Observei, então, que Zacarias fala de “todos os povos” (Zc 12.2), “contra ela, (Jerusalém) se ajuntarão todas as nações da terra” (Zc 12.3), e “eu ajuntarei todas as nações para a peleja contra Jerusalém” (Zc 14.2). Argumentei que esses versículos não pareciam estar falando dos romanos em 70 d.C. Mais adiante, Zacarias continua dizendo: “Naquele dia o Senhor protegerá os habitantes de Jerusalém” (Zc 12.8) e: “Então sairá o Senhor e pelejará contra as nações, como pelejou no dia da batalha” (Zc 14.3). Concluí que tudo isso não se encaixa com o que aconteceu a Jerusalém em 70 d.C., quando os romanos conquistaram Israel. Finalmente, a passagem diz que o Senhor salvará Israel naquele dia (Zc 14.3), ao passo que, em 70 d.C., o Senhor julgou Israel como está escrito em Lucas 21.20-24. Perguntei ao Dr. Gentry: “Como os preteristas podem dizer que Zacarias fala de 70 d.C. se, nessa passagem, o Senhor está salvando o Seu povo?”
É importante lembrar que o Dr. Gentry é um dos mais importantes preteristas do planeta. Sua resposta, em resumo, foi dizer que a Igreja havia substituído Israel. Isso é parecido com o que o falecido David Chilton disse em seu comentário preterista sobre o Apocalipse:
Outra passagem paralela a essa é Zacarias 12, que retrata Jerusalém como um
cálice de tontear para todos os povos (Zc 12.2; cf. Ap 14.8-9), um braseiro
ardente que consumirá os pagãos (Zc 12.6; Ap 15.2). A ironia é que no
Apocalipse, como temos visto repetidamente, o próprio Israel do primeiro século
tomou o lugar das nações pagãs nas profecias, sendo consumido no braseiro
ardente – o Lago de Fogo – enquanto a Igreja, tendo passado pelo holocausto,
herda a salvação. [1]
“Naquele dia o Senhor protegerá os habitantes de Jerusalém” (Zc 12.8). |
Falei ao Dr. Gentry que sua resposta não passava de “divagação teológica”. Ele havia chegado a uma mera conclusão teológica sobre o assunto, mas tinha falhado em dar uma interpretação textual. Perguntei-lhe objetivamente: “O senhor pode dar uma interpretação textual dessa passagem em Zacarias?” Ele respondeu: “Não”.
Os preteristas não conseguem dar uma interpretação textual de Zacarias 12-14
porque acreditam que a passagem se refere ao julgamento de Deus sobre Israel
através dos romanos em 70 d.C. – o que é seu primeiro erro. Greg Beale diz:
“Zacarias 12 não profetiza o julgamento de Israel e, sim, a sua redenção”. [2]
Zacarias 12-14 fala claramente de um tempo quando Israel será salvo pelo Senhor
de um ataque de “todas as nações da terra”, não somente
dos romanos – e esse é o segundo erro. Nesse contexto, evidentemente, “Israel”
tem de ser uma referência a Israel (e não à Igreja). Como essa é a verdade, o
evento de Zacarias 12-14 ainda não aconteceu na História. Isso significa que se
trata de um evento futuro. O Dr. Beale faz um comentário sobre Daniel que se
aplica também a Zacarias:
O ônus da prova recai sobre os preteristas, para que forneçam um raciocínio
exegético, tanto no que diz respeito a trocarem uma nação pagã por Israel como
objeto principal do julgamento final de Daniel, como por limitarem o julgamento
final principalmente a Israel e não o aplicarem universalmente. [3]
Tanto os preteristas quanto os
futuristas (como eu) acreditam que em Lucas 21.20-24 Jesus profetizou a
destruição de Jerusalém pelos romanos em 70 d.C. Usando Lucas 21.20-24 como
base, observe os contrastes entre essa passagem e Zacarias 12-14, conforme
observado por Randall Price:
Contrastes entre Lucas 21.20-24 e Zacarias 12-14:
Lucas 21.20-24:
· Cumprimento passado: “levados cativos para todas as nações” (Lc 21.24).
· Dia da devastação de Jerusalém (Lc 21.20).
· Dia de vingança contra Jerusalém (Lc 21.22).
· Dia de ira contra o povo judeu (Lc 21.23).
· Jerusalém pisada por gentios (Lc 21.24).
· Tempo de domínio dos gentios sobre Jerusalém (Lc 21.24).
· Grande aflição na terra (Lc 21.23).
· Israel cairá a fio da espada (Lc 21.24).
· Jerusalém destruída (70 d.C.) “para se cumprir [no futuro] tudo o que está escrito” [em relação ao povo judeu] (Lc 21.22).
· A desolação de Jerusalém tem um limite de tempo: “até que os tempos dos gentios se completem” (Lc 21.24). Isso significa que haverá um tempo de restauração para Jerusalém.
· O Messias virá com poder e grande glória para ser visto pelo povo judeu somente depois “destas coisas” – os eventos de Lucas 21.25-28 – que são posteriores [futuros] aos acontecimentos de Lucas 21.20-24.
Zacarias 12-14:
· Cumprimento escatológico – “naquele dia” (Zc 12.3,4,6,8,11; 13.1-12; 14.1,4,6-9).
· Dia de livramento para Jerusalém (Zc 12.7-8).
· Dia de vitória para Jerusalém (Zc 12.4-6).
· Dia de ira contra as nações gentias (Zc 12.9; 14.3,12).
· Jerusalém transformada por Deus (Zc 14.4-10).
· Tempo de submissão dos gentios em Jerusalém (Zc 14.16-19).
· Grande libertação para a terra (Zc 13.2).
· As nações trarão suas riquezas para Jerusalém (Zc 14.14).
· Jerusalém salva e redimida, para que tudo que está escrito [em relação ao povo judeu] possa se cumprir (Zc 13.1-9; Rm 11.25-27).
· O ataque a Jerusalém é a ocasião para a destruição final dos inimigos de Israel, encerrando, assim, “o tempo dos gentios” (Zc 14.2-3,11).
· O Messias virá em grande poder e glória durante os eventos da batalha (Zc 14.4-5).[4]
Em razão das diferenças apontadas entre as passagens, é impossível harmonizar Zacarias 12-14 com eventos que já aconteceram. Trata-se de uma tentativa que agride a lógica. Mas algumas das maiores sumidades do preterismo continuam insistindo nesse absurdo.
Alto-relevo
no Arco de Tito que mostra os romanos conduzindo os utensílios |
O preterista Gary DeMar recentemente tentou uma interpretação de Zacarias 14.[5] Como era de se esperar, ele disse que Zacarias 14 “descreve eventos que antecedem a devastação e, inclusive, a própria destruição de Jerusalém em 70 d.C.”[6] DeMar não consegue mostrar a destruição de Jerusalém no texto de Zacarias. Ele interpretou a passagem de uma forma que eu chamaria de abordagem temática. Ele “pulou” e “dançou” em torno da passagem, desnudando-a do seu contexto. Pior ainda, ele a reembalou num falso contexto. Analisando apenas Zacarias 14, DeMar falha em oferecer qualquer evidência de que Deus está submetendo Israel ao juízo, como é claramente perceptível em Lucas 21.20-24. Na verdade, Deus está julgando as nações, pois o texto diz: “Procurarei destruir todas as nações que vierem contra Jerusalém” (Zc 12.9), e: “Eu ajuntarei todas as nações para a peleja contra Jerusalém... sairá o Senhor e pelejará contra essas nações” (Zc 14.2-3). Ao contrário do que diz DeMar, Deus está defendendo (Zc 12.8) e salvando (Zc 14.3) Israel dessas nações. Exatamente como em Mateus 24, em nenhum lugar o texto fala do Senhor vindo em julgamento contra o Seu povo. Tanto Zacarias quanto Mateus estão falando da salvação de Israel (Mt 24.31), e é por isso que o cumprimento das profecias de ambas as passagens será no futuro.
A única maneira que os preteristas encontram para lidar com Zacarias 12-14 é não considerar as palavras e frases no seu contexto literário, mas simplesmente declarar – como fizeram Chilton e Gentry – que a Igreja substituiu Israel. O texto das Escrituras deve ser a base sobre a qual desenvolvemos a sã teologia. Ao invés disso, os preteristas impõem suas crenças teológicas falsas sobre a Palavra infalível de Deus. Walt Kaiser é muito feliz ao fazer o seguinte comentário sobre o texto de Zacarias:
Em nenhum outro capítulo da Bíblia a interpretação de “Israel” é mais
importante do que em Zacarias 14. Dizer que “Israel” significa a “Igreja”, como
muitos têm feito, levaria a uma grande confusão nesse capítulo e no final do
capítulo 13. Por exemplo, Zacarias 13.8-9 afirma que dois terços de toda a
terra (Israel) morrerão, mas poucos se arriscam a dizer que dois terços da
Igreja sofrerão um massacre no dia final. É muito claro que “Israel” se refere
à unidade geopolítica atualmente conhecida como o Estado de Israel.[7]
A Palavra de Deus exorta Sua Igreja a viver na expectativa de um futuro seguro
e na certeza da vitória. Mantendo essa perspectiva, os crentes podem viver
confiantes no presente por causa do futuro. O passado é igualmente importante.
No entanto, uma falsa visão do passado roubará do crente, no presente, a
esperança de que precisamos para viver corajosamente para o nosso Senhor.
Maranata! (Thomas Ice - http://www.beth-shalom.com.br)
Notas:
* Os preteristas ensinam que a maior parte, ou até mesmo todas as profecias já se cumpriram. Eles dizem que as principais porções proféticas das Escrituras (como o Sermão Profético e o livro de Apocalipse) se cumpriram nos eventos relacionados à destruição de Jerusalém pelos romanos em 70 d. C.)
Todas
as citações bíblicas são da ACF (Almeida Corrigida Fiel, da SBTB). As ACF e ARC
(ARC idealmente até 1894, no máximo até a edição IBB-1948, não a SBB-1995) são
as únicas Bíblias impressas que o crente deve usar, pois são boas herdeiras da
Bíblia da Reforma (Almeida 1681/1753), fielmente traduzida somente da Palavra
de Deus infalivelmente preservada (e finalmente impressa, na Reforma, como o
Textus Receptus).
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