CAPiTULO XXIX de Schaff - "Nossa Crença e a dos Nossos Pais"
Meu reino não é deste mundo- João 18:36.
Papa princeps super reges- O papa governa os reis. -Gregório VII.
O Congresso não fará lei tendente só estabelecimento de uma religião ou a
proibição do livre exercício dela. -Constituição dos Estados Unidos.
POR tradição, a igreja católica romana defende a monarquia, que ela considera
a mais excelente forma de governo, e reclama para o papa superior jurisdição
nos negócios humanos. A teoria protestante, conforme se exemplifica nas instituições
americanas, encara a democracia como a melhor forma de governo terreno e favorece
a separação entre a Igreja e o Estado, sendo cada um soberano nas respectivas
esferas. O governo procede do povo e o poder supremo e exercido por magistrados
escolhidos pelo povo, os quais podem ser despojados do oficio pelo mesmo povo.
Se, por dispensação divina, como se tem alegado o pontífice romano se tornou
supremo ditador na esfera da religião e da moral, o exercício dessa prerrogativa
e de molde a se chocar com a teoria moderna da competência da lei civil e
com os direitos individuais.
As relações mútuas entre a Igreja e o Estado tiveram, nos séculos
cristãos, quatro períodos: a supremacia hostil do império romano; a união
dos dois, de Constantino a. Carlos Magno, 312800; a supremacia da igreja,
durante a Idade Media; e a separação dos dois poderes. Ao tempo da perseguição
que os cristãos tiveram de enfrentar, no primeiro período, o sentimento dominante
era o de que, não sendo deste mundo o reino de Cristo a igreja e o império
continuariam a existir, sem apoio legal, do poder civil à igreja. O juízo
de Tertuliano era o de que, terminado o império romano, a presente dispensação
teria chegado ao fim . A atitude assumida pela igreja para com a administração
civil não era de hostilidade, mas de boa vontade, como o demonstram a oração
aduzida a Epistola de Clemente de Roma aos Coríntios e a Apologia de Aristides.
Diz a oração: "Concede aos governos, a quem tenhas outorgado soberania,
6 Senhor, saúde, paz, concórdia, estabilidade, para que possam administrar
sem falhas o encargo que lhes deste".
Quando o cristianismo foi adotado por Constantino, a igreja se tornou
em organização semi-política. Seu progresso e prosperidade exterior cresciam
ou minguavam, segundo se entendia, som o favor imperial. Constantino se considerava
bispo da igreja em assuntos externos. Os imperadores baixaram leis religiosas,
convocaram sínodos e lhes aprovaram os decretos, impuseram penalidades as
igrejas desobedientes e proclamaram, como fez Teodósio, ser a fórmula nicena
de doutrina a única tolerada no império romano, ou tornaram a práticoa do
paganismo e da heresia ofensas capitais, como fez Justiniano. Carlos Magno,
cujo reinado encerrou o período de indiscutível supremacia imperial, foi,
comparado a Davi e chamado por Alcuino o governador do reino e da igreja -
rector regni et ecclesae.
Depois de Carlos Magno, a supremacia do imperador foi substituída pela supremacia papal; e o pontífice romano, como representante da dominação de Deus, proclama-se super-soberano, tanto nos negócios civis como em assuntos religiosos. As distrações da Europa ocidental, conseqüentes à queda do império romano, e a fraqueza de seus governadores civis favoreceram o exercício e o aumento do poder papal. Prerrogativas senhoriais foram reclamadas para seu ofício, sobre toda a igreja e sobre os príncipes, por Nicolau I, que foi o primeiro papa a ostentar coroa. Os soberanos recebiam do papa sua coroa, como garantia ou confirmação do direito de reinar. Os grandes governadores papais dos séculos XI, XII e XIII - Gregório VII, Alexandre III e Inocêncio III - exerceram juízo sobre os reis, decidindo da validade das leis e das alianças nacionais e tragando as fronteiras das nações. O papa e o imperador eram, tidos como depositários de toda a autoridade terrena, tendo, porem, o ultimo seu direito de jurisdição posto nas mãos do papa. A teoria se baseava,na real ou pretensa cessão do direito de reinar, feita a Carlos Magno, por ocasião das solenidades de sua coroação, na catedral de S. Pedro, por Leão III, assim como nas citações das Escrituras e em comparações como as do papa com a alma e o imperador com o corpo, um comparado ao sol e outro a lua, um ao ouro e o outro ao chumbo.. Tão elevado como esta o céu acima da terra - prosseguia a comparação - esta o papa acima do governador terreno; e como a lua deriva do sol a sua luz, assim o imperador deriva sua autoridade do pontífice romano. A concepção de Agostinho, de que os governadores seculares alcançaram o poder mediante a rapina, astúcia, assassínio e guerra, enquanto que o papa era o escolhido de Deus e trazia as chaves do reino dos céus, em razão de ser sucessor de S. Pedro, foi repetida pelos papas.
Gregório VII, 1073-1085, fortaleceu cada vez mais sua posição, citando as palavras do primeiro capitulo de Jeremias: "Hoje te constitui sobre as nações e sobre os reinos, para arrancares e demolires, para destruíres e derrubares, para edificares e plantares". Nem as massas, nem os príncipes eram competentes para por em duvida a arbitraria exegese daquelas palavras, cujas alusões ao Vaticano seriam tão cabíveis, quanto a descrição de Catarina de Aragão, feita por Shakespeare, teria de aplicável aos direitos da mulher nestes tempos modernos. A pretensão papal teve expressão, da parte de Gregório, em declarações tais como estas: "Jesus Cristo, nosso Senhor, o rei da Glória, constituiu a Pedro governador dos reinos da terra"; "Deus não excluiu a ninguém e coisa alguma subtraiu ao poder do papa" - nullum excepit, nihil ab ejus potestate subtraxit - e: "A Pedro foi dado o governo, não só da igreja universal, mas do mundo inteiro". Em desrespeito ao princípio de exegese histórica e atribuindo a um dado autor a significação que ele tinha no espírito, o cardeal Belarmino, cinco séculos depois, continuou a usar das palavras de Jeremias para alicerçar a pretensão papal, como o fizera Pio V antes de Belarmino, em sua bula de deposição de Isabel, e como Pio X o fez, muito tempo depois dele, em 2910, em sua encíclica Barromeo. Inocêncio III, alem de usar das comparações já referidas, afirmou que o papa reina sobre as nações como Pedro andara sobre as águas revoltas do lago da Galiléia, Inocêncio IV disse que a se apostólica havia recebido diretamente de Cristo a realeza pontifícia e temporal - pontificalem et regalem monarchatum - e que os direitos de reinar, como de fazer guerra, pertencem ambos a jurisdição da igreja - gremio ecclesiae ambo gladii habentur. Os papas medievais depuseram e entronizaram reis e príncipes, fomentaram rebeliões, convocaram exércitos para lhes cumprirem os desígnios, lançaram tributos e reduziram a condição de feudos a Sicília, os reinos de Espanha, Córsega, Portugal, Suécia, Polônia e Inglaterra e tentou; em 1299, reduzir a Escócia. A pretensão alardeada pelos pontífices foi defendida pelos teólogos. Em sua Lei dos Príncipes, Tomaz de Aquino declarou ser o papa, por direito divino, o rei supremo do mundo inteiro - supremus totins mundi rex.1 Finalmente, apos haver reduzido a submissão príncipe sobre príncipe, Bonifácio VIII, com sua teoria, foi atacado com sucesso por Filipe o Belo, de França. O conceito medieval persistiu, todavia, como se demonstrou quando Joao XXII, menos de uma geração . ap6s Bonifácio, fez queimar o tratado de Dante sobre a Monarquia, tratado que afirmava que o imperador exerce autoridade por imediata determinação de Deus e não depende da sanção do papa. Na era que se seguiu a Dante, Marcílio de Pádua e Wyclif combateram a acumulação de funções civis e religiosas pelo pontífice romano e sustentaram a opinião de que o papa pode ser deposto por um imperador. Os livros do Paduano foram postos no Index, em 1558. Em sua obra - A Igreja, Wyclif levantou a acusação de que, aceitando o domínio civil das mãos de Constantino, Silvestre havia cometido um erro e aberto. caminho a todas as espécies de males da igreja. A Pedro foi dado domínio evangélico e não autoridade em neg6cios civis.
-Resistindo a revolta religiosa do século XVI, Leão X apelou
para o Estado, no sentido de que cumprisse seu suposto dever, punindo a rebelião
como um crime, processo seguido pelos sucessores de Leão ate o século XVIII.
Aquilo significava a morte judicial dos líderes da Reforma e a morte ou penas
diferentes aplicadas a seus protetores, e ainda guerra declarada, na qual
o Vaticano tomaria parte ativa. Em 1559, Paulo IV alegou, em termos explícitos,
que, como vice-gerente de Cristo, o pontífice romano esta investido da plenitude
da autoridade sobre os povos e os reinos - super gentes et regna -
e exerce juízo sobre todas as pessoas individualmente. Os príncipes, caindo
em heresia, perdem seu direito ao trono. Depondo Isabel, "a pretensa
rainha da Inglaterra", como herética e defensora de heréticos, Pio V
ao mesmo tempo se dizia ser, por eleição divina, "o soberano de todos
os povos e de todos os reinos". 2 Lord Acton tem isto a dizer de Pio
V : "Pio depôs a Isabel e contratou um criminoso para a assassinar...
Apelou para o assassínio, em execução da sentença de excomunhão, e proclamou
ser doutrina segura que qualquer pessoa pode apunhalar a um herético condenado
em Roma, sendo que e herético todo aquele que ataca a prerrogativa papal"
. O historiador também escreveu que "o tiranicídio se tornou geralmente
popular, sob a presumida, se bem que não indiscutível, autoridade de Tomaz
de Aquino. Muito tempo depois da morte de Pio V, aquilo continuou a ser ensinado
pelos mais afamados teólogos, por Gregório de Valência, por exemplo, e Suarez".
E ainda escreveu ele: "Os papas foram não só assassinos por atacado,
mas fizeram do assassínio lei da igreja cristã e condição de salvação".
O escritor citou a Suarez, que em 1613 defendeu a atitude segundo
a qual "os papas podem depor soberanos heréticos que se insurjam contra
os dogmas de fé pertinentes a salvação da alma", e a Zacarias, falecido
cerca de 1990, no ponto em que diz que uma pessoa, estando "sob excomunhão
do papa, pode ser assassinada em qualquer lugar". Em 1580, Gregório XIII,
apos ter responsabilizado a Isabel como causadora da perda de milhões de almas,
anunciou que não hayia duvida de que, qualquer que a tirasse do mundo, com
a reta intenção de servir a,Deus, não só não cometeria pecado, mas alcançaria
méritos. Sixto V, em cujo pontificado foi a Armada Invencível enviada contra
a Inglaterra, auxiliou a empresa de Filipe por ajuste com o rei de Espanha
e ofereceu-lhe, de início, três milhões de escudos e mais tarde um milhão,
contanto que a esquadra efetivamente partisse em 1588. Três anos depois, Gregório
XIV, 1591, escreveu que considerava de seu dever fazer tudo quanto pudesse
para exterminar os huguenotes, até mesmo concluindo aliança com os turcos
contra a França e no mesmo ano mandou um exército a França para ajudar a proteger
a religião católica, tendo abençoado os estandartes das tropas.3
Quando Tiago exigiu dos católicos ingleses o juramento, pelo qual
renunciavam ao . direito papal de depor os reis, Paulo V condenou o juramento.
Clemente XI, escrevendo a seu "amado filho em Cristo", Luiz XIV,
a.16 de abril de 1906, contestou que um povo protestante tivesse direito de
escolher seu soberano, sem anuência do pontífice. "Uma pessoa não-católica
não pode, sem afronta a igreja, assumir o sagrado titulo de rei. Assim fazendo,
são fulminados pela Palavra de Deus - `Tendes reinado, mas não por meio de
mim"'. Clemente se referia ao primeiro rei da Prússia, um protestante,
que havia sido coroado poucos anos antes.
A super-soberania do papa teve um vigoroso defensor no cardeal Belarmino,
que, em seu cuidadoso estudo da jurisdição, derivou o direito do papa da excelência
da monarquia como forma de governo, assim como da eleição divina. Trouxe,
todavia, sobre si a repreensão do papa, por ter distinguido entre autoridade
direta e indireta, exercida pela se papal, assim se apartando de toda a teoria
medieval. Belarmino estabeleceu três teorias possíveis em relação a soberania
papal: 1. O papa tem, por direito divino, absoluto poder - plenissimam
potestatem - sobre toda a terra, tanto em matéria civil como em negócios
eclesiásticos, tanto sobre povos pagãos como sobre povos cristãos. 2. Ele
não tem autoridade temporal, opinião que o cardeal atribuiu a Calvino. 3.
Ele tem suprema autoridade na igreja e autoridade indireta em assuntos temporais.
Esta última teoria ele a comentou, esclarecendo que o pontífice, como principal
Líder espiritual summus princeps spiritualis - só exerce suprema autoridade
em assuntos temporais, na medida do que for necessário para assegurar o bem-estar
das almas. Para alcançar semelhante fim, ele pode mudar os reinos, entronizar
reis e depô-los e confirmar ou anular leis. Belarmino defendeu vigorosamente
a decisão de Paulo V, de 1606, de que era ilegal que os católicos afirmassem
sob juramento que o papa não tem autoridade para depor os reis. Com os olhos
postos nas idéias medievais, de que o imperador é representante do poder civil
coletivo, o cardeal preconizou como ideal tivesse a Europa um governo único,
ideal que, por considerações geográficas e de outras espécies, ele considerou,
todavia, de impossível realização em seu tempo.
Rejeitando a soberania papal, os Reformadores foram
demasiadamente longe no rumo oposto e atribuíram ao Estado funções reguladoras
dos negócios eclesiásticos. Lutero, cujo espírito. não se inclinou para as
coisas de governo, usava, às vezes, de linguagem muito aproximada da que define
a atitude americana. Em seu escrito sobre o poder civil, disse que "Deus
instituiu dois governos, o governo de Deus exercido por Cristo e o governo
do mundo exercido pelo magistrado civil, cada um com suas próprias leis e
direitos, e as leis do reino terreno não vão além do corpo e dos negócios
exteriores da terra. Sobre a alma, Deus não pode nem quer colocar ninguém
a governar, senão exclusivamente a ele próprio". A mente de Calvino,
inclinada para a administração, elaborou um sistema que devia tratar as duas
esferas como se fossem coordenadas, mas o Reformador falhou no subtraí-las
à superposição. Na secção de suas Instituições dedicada ao governo, definiu
como dever da administração civil "sustentar o culto externo de Deus,
preservar as verdadeiras doutrinas da religião, defender a constituição da
igreja e regular a vida dos homens da maneira requerida pelo bem-estar social
e livrar-nos de viver confusamente, à maneira de ratos em paiol".
O Estado de Genebra era uma teocracia, na qual as funções, agora
consideradas da competência da igreja, eram exercidas por funcionários civis.
Estes elegiam os presbíteros da igreja, puniam de morte a blasfêmia, proibiam
que os pais dessem nomes de santos católicos romanos a seus filhos, baniam
heréticos ou os executavam e lançavam impostos para o sustento do ministério.
Entretanto, insistindo em que o único direito da igreja era o de excomungar
a seus membros e determinar as qualificações do ministério e as exigências
para a.participação da Ceia do Senhor, e insistindo especialmente em ser a
consciência o ultimo juiz nas matérias estritamente religiosas, Calvino se
colocou no caminho ' de que iria resultar o tornar-se cada um dos poderes,
em sua pr6pria esfera, soberano. 4 Sua declara~ao abrangente foi a de que
"ninguém esta sujeito ao governador, a não ser no Senhor" Instt.
4:20, 32.
0 esquema político de Calvino foi adotado pela confissão de Westminster
e outras Confissões Calvinistas, e os parágrafos que o definiam foram lidos
e relidos pelos Puritanos da Nova Inglaterra. Seus princípios foram introduzidos
no Corpo de Liberdades do Massachusetts, de 1641, e na Plataforma de Cambridge,
de 1648. Os magistrados civis, que, de acordo com Isaias 49:23, eram chamados
aios da igreja, sustentavam o direito de convocar sínodos e aprovar-lhes os
atos, coletar taxas para o sustento do culto religioso, banir e ate levar
a morte os dissidentes da "ordem estabelecida" .
A despeito do insucesso dos Reformadores, no tornarem clara a distinção
entre as funções das duas esferas de poder, os princípios fundamentais da
Reforma, principalmente nas terras que adotaram o tipo calvinista, demonstraram
ser a sementeira fecunda da democracia moderna e da separação entre a Igreja
e o Estado. O próprio Calvino passou alem de sua primitiva teoria, de ser
a aristocracia a melhor forma de governo civil, e em 1559 tomou a direção
da democracia, ao pronunciar-se pelo governo "nas mãos de muitos, de
modo que, se algum se arrogar mais do que for justo, os demais procedam como
censores e chefes, para refrear a ambição do homem de governo". Segundo
o desenvolvimento que lhe deram os sucessores de Calvino, Beza, Hotman e outros
professores de Genebra, Ponet, bispo de Winchester, que passou algum tempo
em Genebra, a huguenote du Plessis Mornay e outros publicistas protestantes,
a teoria normativa em voga entre as nações da Europa ocidental veio a ser
a de que o governo existe "por consentimento do povo".
O governo - doutrinaram aqueles escritores - se baseia num contrato,
tácito ou expresso, entre o povo e o príncipe. Quebrando o compromisso, o
príncipe pode ser deposto e, se necessário, sofrer oposição armada. Essa teoria
eles a derivaram das Sagradas Escrituras e da lei natural. Genebra deu o exemplo
do governo oriundo de parlamentos, em contraste com um soberano a reinar por
direito de sucessão ou por aprovação papal, sendo que aquela forma de governo
foi condenada por Belarmino. O direito de afastar os reis pertence, segundo
os escritores calvinistas, não "aos particulares", isto é, indivíduos,
mas ao corpo de magistrados ou a uma assembleia da nação. No caso de o governador
violar o pacto, o povo, através de seus representantes, tem o direito de consulta
e, se necessário, de substituição do governo.
Semelhante teoria tem notável expressão na Holanda, Escócia e Inglaterra,
países que abriram as portas a liberdade constitucional. Na Escócia, onde
a Reforma foi estabelecida por ato do parlamento, João Knox, a pergunta formulada
pela rainha Maria: "Pensas que os súditos, tendo meios, possam resistir
a seus príncipes, recorrendo a violência?" - respondeu: "Sem dúvida
que o podem, Senhora, desde que os príncipes se excedam". Na Holanda,
quando Guilherme o Taciturno pediu o parecer de Mornay sobre se os holandeses
eram obrigados a continuar sob o despotismo de Filipe II, teve como resposta
que, havendo Filipe quebrado o contrato que celebrara entre si mesmo e o país,
os holandeses teriam razão se fizessem o mesmo e renunciassem a seu governo.
Em sua Defesa da Liberdade contra os Tiranos, Mornay expôs a teoria,
servindo-se de palavras como estas: todos os governadores recebem do povo
sua autoridade. O governador é somente o ministro do Estado; o povo é o último
Senhor. A obrigação existente é recíproca. A autoridade do povo, quando age
como um corpo, é superior à prerrogativa do governador. Se o príncipe descumpre
sua obrigação, o povo pode refreá-lo ou negar-lhe obediência. O contrato entre
eles se torna caduco. Em obediência a essa teoria; o povo dos Países-Baixos
adotou a Declaração de Independência; em 1581. Na Inglaterra foram os Calvinistas
e os princípios calvinistas que sustentaram a mais notável de todas as lutas
pela liberdade constitucional. Um dos episódios dessa luta foi o combate dado,
sob os príncipes Stuarts, a teoria do direito divino dos reis, terminando
com a Declaração de Direitos, de 1689. Entrementes, o Longo Parlamento havia
representado a vontade popular e executado a Carlos I, por ter rompido seus
compromissos para com a nação.
Estava reservado as colônias norte-americanas o se tornarem a pátria
do governo absolutamente popular e da absoluta liberdade religiosa. O povo
trazia esses sentimentos no sangue; por herança e pela recordação das opressões
civis e religiosas que o haviam forçado a buscar novos lares em região selvagem
e remota. O Ato Holandês de 1581 foi seguido pelo Pacto de Mayflower; pelo
qual os signatários "se uniam sob compromisso num corpo civil";
semelhante declaração foi mais tarde seguida, na Inglaterra, pela Aliança
Solene e Pacto, pela Lei de Direitos, pelo Instrumento de Governo de Cromwell,
e, na América, pela Declaração de Independência e pela Constituição de 1789.
Desde o princípio, era familiar a Nova Inglaterra a significa~ao de um pacto
publico, graças aos pactos da igreja, pelos quais os membros da congregação
se uniam; e a soberania popular progredia, graças aos comícios municipais,
em que se travavam debates em torno de negócios públicos. Determinando a celebração
do terceiro centenário de Plymouth, a 21 de dezembro de 1920, o presidente
Wilson o fez, como escreveu, "em razão da influência que os ideais e
princípios dos Peregrinos, no tocante a liberdade civil, tiveram na formação
e crescimento de nossas instituições e de nosso desenvolvimento e progresso
como nação". A opinião no Massachusetts não esperou pela Convenção local
de 1774, para conjugar "as liberdades civil e religiosa". Na Virginia
se preparou o advento de sua união, através da independência do espírito cavalheiresco
e do espetáculo de Presbiterianos e Batistas, despojados de direitos civis
pela religião estabelecida e reduzidos a mendigar o privilégio de praticar
o seu culto. Foi um notável indício de orientação providencial o fato de as
colônias do Norte e do Sul se terem unido na luta pela independência internacional
e que a Constituição Americana tenha sido escrita por ato conjunto de seus
Líderes. Pelo princípio de soberania popular, o governo e do povo para o povo
e pelo povo, como o expoente de nossas instituições, Lincoln, o definiu. Pelo
princípio de igualdade religiosa perante a lei e separação entre a Igreja
e o Estado, o governo é obrigado a não tomar parte no estabelecimento de qualquer
religião, ou demonstrar preferência por qualquer forma particular de culto
religioso. Uns poucos dias antes que fosse assinada a Declaração de Independência,
já a Virginia havia abolido a Igreja Episcopal como culto oficial e feito
a declaração que todos os homens são igualmente dignos "de livre exercício
de sua religião, segundo os ditames de sua consciência" .
- A extensão em que os cidadãos cat6licos romanos dos
Estados Unidos podem dar pleno assentimento aos dois princípios da Constituição
- a soberania popular e a igualdade religiosa - e questão que admite uma de
duas respostas, sendo uma baseada em pronunciamentos papais e outra em declarações
procedentes de eminentes prelados e leigos americanos, de religião cat6lica
romana. Segundo os pronunciamentos papais, pode parecer que o pontífice romano
venha, em qualquer tempo,, se assim o preferir, a exercer o direito de impor
a cidadãos americanos mandatos inconsistentes com as leis de seu governo.
Por outro lado, os cidadãos americanos asseguram que não pode haver, em hipótese
alguma, conflito entre as obrigações para com o "santo padre" e
a submissão leal às leis do pais. Em abono dessa afirmativa dá-se relevo a
seu patriotismo em nossas guerras, a partir de 1776. 0 cardeal Gibbons e o
arcebispo Ireland, de S. Paulo, tem dado publicamente irrestrito aplauso aos
princípios americanos de liberdade religiosa e da separação entre a Igreja
e o Estado, assim como aos institutos republicanos. Num discurso pronunciado
no Clube Católico de Filadélfia, a 6 de fevereiro de 1893, disse o cardeal:
"Estou firmemente persuadido, tanto pelo estudo como pela observação,
que a igreja é mais próspera quando se acha livre para levar avante sua divina
missão, sem qualquer interferência do Estado. Aqui, graças a Deus, a igreja
é livre e é, por isso, próspera. Aqui a Igreja e o Estado marcham em linhas
paralelas, assistindo-se mutuamente e nenhuma das partes interferindo indebitamente
nos domínios da outra. Os católicos americanos se regozijam com nossa separação
entre a Igreja e o Estado e não podem conceber que algum jogo de circunstâncias
possa surgir, que torne a união desejável, quer da parte da Igreja, quer da
parte do Estado". O arcebispo Ireland qualificou a primeira emenda a
Constituição, estabelecendo a separação dos dois poderes, como "um grande
avanço em direção a liberdade pessoal". Mais adiante declarou: "Nós,
católicos, não alteraríamos, ainda que o pudéssemos, a Constituição, em homenagem
à liberdade religiosa". No famoso discurso pronunciado em 1913, de que
se tiraram as citações acima, o eloqüente prelado repudiou a alegação de que
a obediência ao papa seja, de qualquer modo, inconsistente com a Constituição.
O mais recente testemunho é o que foi dado pelo governador Alfredo
E. Smith, do Estado de Nova York, em abril de 1927, em notável resposta a
perguntas publicamente apresentadas a ele, como candidato a presidência dos
Estados Unidos. 0 governador afirmou que "não reconhecia autoridade às
instituições da igreja romana para interferir nas operações da Constituição
dos Estados Unidos ou violar a lei do país"; e declarou que "acreditava
na absoluta liberdade de consciência, outorgada a todos os homens, e na igualdade
concedida a todas as igrejas e todas as seitas, perante a lei, como matéria
de direito e não como favor; na absoluta separação entre a Igreja e o Estado
e no escrupuloso respeito da Constituição, declarando que o Congresso não
fará lei tendente ao estabelecimento de religião; no apoio da escola pública,
como uma das pedras angulares da liberdade americana; e no direito de todo
pai de escolher se os filhos serão educados na escola pública ou em escolas
religiosas, mantidas pelos de sua própria crença.
Declarações como essas deviam ser suficientes para deixar em repouso
toda duvida concernente à perfeita fidelidade dos cidadãos católicos romanos
à lei americana - 1) se elas fossem oficialmente aprovadas pelo Vaticano e
2) se se fixassem os limites que circunscrevem a província eclesiástica. A
palavra do pontífice romano é final e exige a obediência dos católicos romanos
espalhados pelo mundo. O pronunciamento emanado do mais alto dignitário ou
de uma reunião de prelados, por mais solene que seja, só tem autoridade na
medida em que se ajuste a política papal. Em primeiro lugar, nenhum papa moderno
demonstrou estar a favor das idéias americanas ou explicitamente repudiou
a teoria medieval do poder, segundo a qual o papa e o super-soberano, Leão
XIII reafirmava as pretensões de seus predecessores quando, em suas encíclicas
conhecidas como a Constituição dos Estados e a União da Cristandade, revelou
ao mundo moderno que ele, papa, fora designado para ser o cabeça de todos
os governadores e ele mesmo ocupa na terra o lugar de Deus Onipotente. Em
segundo lugar, os papas modernos têm-se colocado definitivamente, ao que parece,
contra a lei da igualdade religiosa, enunciada na Constituição e interpretada
pela Corte Suprema dos Estados Unidos. Em terceiro lugar, os princípios sustentados
pela maioria dos cidadãos americanos, no tocante a educação, ao caráter sagrado
do matrimônio e provavelmente também sobre os direitos do clero como classe
especial, estão em conflito com as ordens do Vaticano.
Em seu livro - A Igreja Católica e o Estado Cristão - o cardeal
Hergenroether - 1:804 - estabeleceu como norma que a igreja não renuncia,
em princípio, a nenhuma reivindicação que ela sempre tenha feito. A asserção
do cardeal não foi tão forte como a declaração feita por Leão XIII em sua
imortale dei, 1885, quando disse: "Se os católicos nos derem ouvido,
como lhes cumpre dar, verão quais são os deveres de cada um em assuntos de
opinião e de ação. No que se refere a opinião, aquilo que os pontífices romanos
já ensinaram ou venham a ensinar no futuro, deve ser observado com firme disposição
de espírito, e, tanto quanto a oportunidade o requeira, deve ser abertamente
professado". Se os pontífices romanos, em seu modo de tratar os Estados
e o poder civil, durante a Idade Media, agiram em virtude de sua prerrogativa
infalível, e difícil compreender como possa o papa repudiar tais conceitos,
como política permanente do papado, nos dias atuais, sem que renuncie a pretensão
de infalibilidade.
Recentes pronunciamentos papais, feitos a partir de Pio IX, concorrem
para perpetuar o receio de possível intromissão do papa nos negócios sociais
e civis americanos. Um dos princípios sob os quais agiu a se romana, foi o
de transformar as nações em feudos e pedir-lhes o pagamento de perpétuo tributo
pecuniário. Outro princípio foi o direito, na qualidade de possessão sua por
direito divinamente conferido, de distribuir à vontade terras e países. À
partilha da América entre Espanha e Portugal, feita por decreto papal, podem-se
acrescentar outros casos, como a dádiva feita aos portugueses, por Eugenio
IV, de todas as terras descobertas por eles do Cabo Horn à Índia; a dádiva
das Canárias à casa real de Castela, feita por Clemente VI, em 1344, e os
primitivos presentes da Irlanda a Henrique II e da Inglaterra ao rei da França.
A quinta pergunta que a Klu-Klux-Klan faz aos candidatos a admissão em seu
grêmio é esta: "Crês nas instituições características de nosso governo
e nos direitos constitucionais de liberdade da palavra, liberdade das escolas
públicas, imprensa livre e separação entre a Igreja e o Estado?"
Os pronunciamentos papais dos últimos cinqüenta anos parece demonstrarem
estudada hostilidade às instituições da sociedade moderna. O Syllabus de
Erros Modernos, publicado por Pio IX, condena os princípios da liberdade
religiosa e da separação entre a Igreja e o Estado e também a proposição:
"A lei tem sabiamente disposto, em alguns paises, chamados católicos,
que a pessoa que venha a residir neles seja obrigada ao exercício publico
de seu próprio culto". Pio também condenou a proposição segundo a~ qual
os papas sempre tem usurpado o direito dos príncipes. Vinte anos depois, como
ja foi referido, Leão XIII, em sua immortale dei, citou o Syllabus
como tendo adequadamente fulminado como "falsas" opiniões segundo
as quais a liberdade de ensino e de culto não são fontes de muitos males e
que a soberania reside na massa do povo. Leão afirmou que o Estado ideal é
o Estado em que a igreja católica existe, com exclusão de todas as outras
formas de culto. As condições morais prevalecentes na Idade Media e tidas
como ideais, quando não havia tolerância para nenhuma outra forma de religião
a não ser a Católica, devem ser revigoradas. Na igreja romana reside a verdade.
Toda discordância com ela vem a ser erro em matéria religiosa e revolta contra
o Estado ideal. Leão também louvou a Gregório XVI, por ter, "com palavras
pesadas, invectivado os sofismas", no tocante a ser justo que o indivíduo
formule seu próprio juízo em religião, que a consciência de cada homem seja
seu único e suficiente guia e que da separação entre a Igreja e o Estado qualquer
melhoria se deva esperar em benefício de qualquer das esferas. Depois, Leão
considerou ilegal que os Estados pusessem as varias formas de religião no
mesmo pe de igualdade e, em sua encíclica de 6 de janeiro de 1895, dirigida
aos bispos americanos, afirmou ser erro crer que o exemplo dado pela América
seja de mais proveito para a igreja e que sempre seria correto ou conveniente
que os negócios civis e sagrados fossem desassociados, como o foram pelo costume
americano - rei civiti reique sacrae dissociatae more Americano. A
essas declarações deve ser aduzida a encíclica de Pio X, de 8 de setembro
de 1909, condenando o Modernismo, na qual igualmente depreciou a separação
entre a Igreja e o Estado, asseverando que a liberdade de estudos e favorável
a corrupção moral e espiritual do povo.
Se tais declarações, expedidas do Vaticano, devem ser recebidas
em toda sua significação, a conclusão razoável parece ser a de que, quando
as circunstancias forem favoráveis, se tal acontecer alguma vez, a obediência
ao santo padre poderá exigir que os católicos americanos tomem atitude hostil
a Constituição. A justeza dessa conclusão e abonada por escritores que se
retiraram da, comunhão romana. Algumas dessas pessoas, enquanto permaneceram
na comunhão romana, gozaram de reputação como eruditos e como possuídores
de devotamento eclesiástico. "É princípio do Ultramontanismo" -
diz o professor Koch - "que o reino de Deus é deste mundo e que o poder
das chaves inclúi jurisdição secular sobre os Estados e sobre os governantes.”
Entre as citações de Koch, figuram pronunciamentos de escritores jesuítas,
para firmarem a idéia de que "os governos civis devem subordinar-se ao
papa e que o papa é o supremo juiz das leis civis". Criticando a encíclica
de Pio X sobre o Modernismo, Tyrrell fala da igreja como estando reduzida,
para todos os efeitos práticos, a uma burocracia - e queixava-se de que os
papas censurem "nosso desejo de separar a Igreja do Estado, reputando
como defeito aquilo que é uma de nossas melhores aspirações". Certos
eventos da Europa moderna parece terem mostrado que a prática papal é adversa
ao princípio americano. Bastam uns poucos exemplos. No Piemonte e no Reino
da Itália, a concessão da liberdade religiosa foi combatida palmo a palmo
pelo Vaticano, que mobilizou suas forças contra a conversão em lei da proposição
de Cavour: "Uma Igreja livre num Estado livre". Na França, a lei
de 1905, denunciando a concordata napoleônica de 1802 e pondo fim. a manutenção
de clérigos e escolas dirigidas por ordens religiosas, foi combatida por Pio
X em sua bula datada de 11 de fevereiro de 1906. Em 1911, Pio X declarou nula
a lei portuguesa de separação entre a Igreja e o Estado.
Apos a incorporação de Roma ao reino da Itália, 1890, o Vaticano
proibiu aos católicos italianos de tomarem parte em política e votarem, ordem
que por muitos anos permaneceu em vigor. O princípio de ser direito do papa
vedar a católicos Romanos a política militante, foi definida por Leão XIII.
Canonizando certos santos, o Vaticano ultimamente decidiu não somente imprimir
sua marca de aprovação a certos inquisidores, cuja açao levara à morte seus
semelhantes, mas exaltar a homens outrora declarados traidores pelo Estado,
como, por exemplo, João Felton, beatificado em 1886, que fora executado por
haver afixado em Londres a bula de Pio V, depondo a Isabel. E Pio V, que tramava
o assassínio da rainha, é também santo do calendário romano! No conflito havido
no México, em 1927, entre o Estado e a Igreja, Pio XI, apoiando os sacerdotes
em sua oposição a Constituição Mexicana, tratou-os como "anjos sofredores".
Em 1857, quando da adoção da Constituição Mexicana, que abolia os tribunais
clericais, secularizava o casamento, tornava leigo o ensino e concedia liberdade
religiosa, Pio IX publicou um decreto, declarando aqueles preceitos "nulos,
inoperantes e sem qualquer valor". Os Cavaleiros de Colombo pediram,
em 1927, que o governo dos Estados Unidos interviesse na execução da Constituição,
ato felizmente contrabalançado por uma carta de arcebispos americanos, discordando,
em princípio, de tal interferência em negócios internos de uma nação irmã.
Qual seja a pretensão da hierarquia romana, foi revelado quando, em jantar
publico oferecido em Boston a Mr. Taft, a 18 de março de 1912, o cardeal O'Connel
foi colocado logo abaixo do presidente, lugar naturalmente reservado ao governador
do Massachusetts, Mr. Foss, que, ao ouvir do arranjo, declinou de comparecer.
Declarando ilegal a colocação das varias formas de culto no mesmo
pé de igualdade com a "verdadeira religião", Leão XIII entrou em
conflito com a Corte Suprema que, citando Marshall, no caso Watson versus
Jones, havia decidido que "nossa lei não conhece heresia e não se destina
ao apôio de nenhum dogma, nem ao estabelecimento de nenhuma religião".
Quando a bula de Leão contra o Americanismo apareceu, em 1899, o arcebispo
Ireland publicamente repudiou atitudes que antes havia assumido, asseverando
que, quando a questão era a de submissão a santa sé, não lhe restava alternativa,
sendo que "os católicos leais não tem senão uma norma de ação: a vontade
e o exemplo de Leão. Quando os bispos franceses ou alemães estão com o papa,
eu estou com eles; quando, porém, eles estão contra o papa, então estou contra
eles".
A separação entre a Igreja e o Estado e a verdadeira concepção
da igreja foram admiravelmente expostos numa decisão da Corte de Apelação
de Nova York, em 1927, que declara: "O reino de Cristo sobre a terra
é a comunidade ou todo o corpo do povo fiel a Cristo, coletivamente; todos
os que se acham espiritualmente unidos a Cristo, como cabeça da Igreja, sem
atenção a diferenças de credo e doutrina. Sua causa progride de diversas maneiras,
principalmente através da obra de associações religiosas e instituições educativas
e caridosas, de caráter religioso".
- Por meio século, a contar de 1870, quando Roma se
tornou capital do Reino da Itália, os papas têm lamentado a perda de sua soberania
temporal sobre aquela cidade. Há mais de mil anos, Pepino brindou o papa Estevão
com os territórios que havia conquistado aos Lombardos. Resistindo as aspirações
dos patriotas italianos a um reino unido, com as palavras "Não podemos
- non possumus" - visto que tal coisa equivaleria a renúncia de
seu título civil, Pio IX continuava a ser governador da cidade, graças ao
auxílio dos austríacos e mais tarde de Napoleão III e de uma guarnição de
10.000 franceses. O desgoverno papal e sacerdotal de Roma se tornou proverbial.
Pessoas que visitaram a cidade antes de 1870, foram unânimes no registrar
a venalidade dos funcionários, a freqüência dos crimes, a imundície das ruas
e as exações impostas aos visitantes. As moedas eram deliberadamente falsificadas
e enganosas no peso. Floresciam as loterias. Numerosas eram as casas de expostos.
A censura à imprensa era rígida.5 Quando, pela esmagadora votação de 133.648
contra 1.507, os cidadãos de Roma transferiram sua cidade ao rei e governo
da Itália, Pio protestou contra o ato, considerando-o roubo e afirmando ser
legal, sagrado e inviolável o direito papal à cidade, e "condenados,
desfeitos, anulados e ab-rogados os atos dos invasores - invasorum acta";
e por cima invocou a Deus e a todo o mundo católico como testemunhas de que
ele, papa, se fizera prisioneiro do Vaticano e incapaz de exercer sua autoridade
pastoral com segurança, eficiência e com qualquer parcela de liberdade. O
papa havia condenado, seis anos antes, nas proposições do Syllabus,
os que favorecessem a abolição do poder temporal; e em 1862, segundo Straub,
convidou todos os bispos a pregarem que a autoridade civil fora conferida
a Santa Sé e que sob nenhum pretexto poderia ser ela objeto de renúncia. Os
sucessores de Pio continuaram a renovar o protesto. Assembleias de prelados
católicos romanos e prelados individualmente têm clamado por que seja restituída
ao papa sua propriedade.6
Tornou-se habito impingir aos católicos romanos a idéia de que o
papa é "o prisioneiro do Vaticano". Em Bruxelas e em outras cidades,
vendiam-se pinturas representando a Pio entre barras de ferro. O cardeal Gibbons
e outros altos prelados americanos se uniram para dar a impressão de que atualmente
o papa se acha encerrado num cárcere. Em sua História da Bíblia, p.
281, o bispo Gilmour declara que "em 1870, Vitor Manuel tomou Roma e
tem-na desde então em seu poder, conservando o papa como prisioneiro no Vaticano".
Ainda recentemente, 1922, o periódico romano Month, traçando o necrológio
de Bento XV, referiu-se aquele pontífice como quem tinha vivido em sua "prisão
palatina" .
Em 31 de março de 1889, protestando contra a perda da soberania
temporal, Leão XIII outra vez qualificou a ocupação de Roma como ato de violência,
despojando o pontífice de seus soberanos direitos civis, e também como ato
de grupos de malfeitores, agindo contra a vontade do povo - non populorum
voluntas sed sectarum pravarum audacia. Outra vez, a 3 de maio de 1892,
numa carta aos cardeais franceses - Obras, 5:71 - Leão afirmou que
não pode existir liberdade para o pontífice, a não ser que ele seja um soberano
independente. Entre os mais perseverantes advogados do poder temporal do papado,
figura o cardeal Manning, que afirmou tratar-se de um poder ordenado por Deus
e sagrado por todos os direitos inerentes a outros poderes, e por direitos
e sanções que transcendem a todas as demais autoridades da terra. O Cardeal
Gibbons apresentou as seguintes razões em abono da justiça da pretensao papal:
1. A soberania papal é a mais antiga em relação ao tempo. 2. Não foi estabelecida
pela espada. 3. O governo papal era benéfico. 4. Os interesses do Cristianismo
exigem que o vigário do Príncipe da Paz possua uma herança territorial, "que
seja inviolável, para que os papas possam tratar livremente, em todas as ocasiões,
com as nações e os povos". A ocupação de Roma pelo governo italiano -
interpreta o cardeal foi grave quebra do mandamento "não furtarás"
e comparou-o a "ímpia apropriação da vinha de Nabote", por parte
de Acabe.
A ilusão de que o papa fora ilegalmente despojado da autoridade
temporal pelo voto do povo romano tem sido ensinada às crianças americanas
no Catecismo Plenário de Baltimore, III:539, 540. Esse documento, recomendado
pelas mais altas autoridades eclesiásticas, afirma que o poder temporal o
papa o obtivera por doação feita por aquele que podia fazê-lo; que "esse
poder temporal foi arrebatado por um ato de violência"; e, ainda mais,
que o papa, "como governador temporal ou ordinário, tem o direito de
governar estados e possuir bens que tenham vindo legalmente ter às mãos da
igreja". O titulo papal, baseado nas dotações de Pepino, tem sido ultimamente
defendido por um escritor americano, na Revista Católica de História,
abril de 1921, ao declarar: "o título do papa ao seu principado temporal
repousa verdadeiramente sobre todos os princípios de justiça e de honra".
Se tal for o ponto de vista dos prelados e escritores americanos, que garantia
possui o público americano de que o mesmo princípio não se possa também aplicar
a soberania americana?
Quanto a validade do direito decorrente de doação real, feita na
séculos, ela não se ajusta a moderna opinião acerca de direitos legais. De
acordo com o código de seu tempo, a dádiva de Pepino era bastante regular.
Mas se aquela dádiva constitui perpetua pretensão à jurisdição civil sobre
Roma, por que as dádivas feitas do papa por outros soberanos não constituiriam
títulos possessórios igualmente válidos, como a Córsega, Sardenha, Sicília
e Toscana? Por que não poderia hoje o papa, com o mesmo fundamento, reivindicar
validamente a Inglaterra como feudo papal? Não fora ela dada por João a Inocêncio
III e seus sucessores, para que lhes pertencesse para sempre? Se a antiguidade
do título constitui direito final à autoridade civil, então a dádiva deste
continente Ocidental à Espanha e Portugal, feita por Alexandre VI, continua
a ser direito legal "perpétuo" e a ocupação de partes dele por povosanglo-saxões
é roubo e sacrilégio. O cardeal Gibbons diz que "o povo de Roma não podia
dar aquilo que lhe não pertencia". A Declaração Americana de Independência,
firmando o princípio contrario, estatui o direito soberano do povo para mudar
a forma de governo que ele tenha herdado.
O pontífice atual, Pio XI [Ao tempo em que esta obra foi escrita,
ainda não havia subido ao trono papal o antigo diplomata Eugenio Paccelli,
agora Pio XII. N. do T.], continuando a protestar contra a perda da soberania
papal sobre Roma, declarou (23 de dezembro de 1922), que o próprio pontífice
e a única autoridade competente para formular juízo sobre a questão do poder
civil do papa, tanto mais que ele envolve as reivindicações e a dignidade
da sé apostólica. Roma - disse ele - é justamente a sede de uma soberania
que abraça todos os povos e todas as nações. Ao fim do Ano Jubilar, 15 de
dezembro de 1925, Pio teve ocasião de outra vez insistir na perpétua legalidade
do título do papa como soberano de Roma. Recordou aos peregrinos que, enquanto
eles tinham tido liberdade de circular pelas ruas da metrópole do Cristianismo,
o vigário de Cristo e pai dos fieis estava privado de tal liberdade. Enquanto
perdurarem as presentes condições, ele não pode nem deve cruzar o limiar do
Vaticano. Ainda outra vez, a 21 de fevereiro de 1926, no decorrer de uma alocução
dirigida ao cardeal Gasparri, tratando das relações do Vaticano para com a
Itália, Pio falou da atual posição do papa em Roma, como "a condição
iníqua imposta à santa sé", e acrescentou que, enquanto ela continuar
a lhe ser imposta, não será possível que o papa chegue a qualquer acordo com
o governo italiano, nem que atravesse o limiar do Vaticano.
Nova fase se abriu a questão graças a um artigo publicado no órgão
papal, o Osservatore Romano, em outubro de 1927, propondo que o governo
italiano consigne a jurisdição papal suficiente território, à margem direita
do Tibre, para que se constitua um Estado Papal, com autoridade civil, renunciando
ao apelo para quaisquer outras nações católicas romanas, a não ser a Itália,
para fazer valer a pretensão.
A sabedoria e a conveniência de a autoridade papal assumir jurisdição
civil, fazendo, desse modo, periclitar sua força espiritual, são postas em
dúvida, mesmo nos círculos católicos romanos. Seja como for, os protestantes
insistem em que o papa tem tanta razão para reivindicar a soberania sobre
Roma, contra a vontade do povo, como tem presentemente para reclamar soberania
sobre qualquer outra porção do mundo.
- Altos dignitários católicos romanos têm pretendido também
que o governo Americano foi modelado segundo o paradigma da igreja romana.
Dando ênfase à suposta derivação do princípio americano de governo de fontes
católicas romanas, o cardeal Benzano, falecido em 1927, outrora legado apostólico
junto à igreja romana nos Estados Unidos, falando em 1922 aos estudantes do
Colégio Americano, de Roma, disse: "Os Estados Unidos se baseiam em princípios
que, por séculos, têm sido ensinados desassombradamente e defendidos pela
igreja de Roma" - América, 24 de fevereiro de 1923. A pretensão
se apresenta nestes termos: o presidente dos Estados Unidos corresponde ao
papa. O presidente nomeia seu gabinete. O papa nomeia os cardeais. Os vários
Estados correspondem as dioceses e os governadores correspondem aos bispos.
Em resposta, é preciso que se diga que nenhuma comparação poderia ser mais
infeliz. O presidente dos Estados Unidos é eleito pelo povo. O papa não é
eleito pelo povo. 0 presidente é órgão executivo. O papa reúne em si mesmo
os três poderes - legislativo, judiciário e executivo. É legislador, quando
elabora as leis; órgão executivo, ao dar cumprimento a essas leis; e juiz,lavrando
sentenças sobre pessoas e fatos. Pela Constituição Americana, essas três funções
se mantêm distintas e se repartem entre o Congresso, a Corte Suprema e o Presidente.
O papado é monarquia absoluta. Nos Estados Unidos o povo é soberano e a ele
pertence originariamente o poder. Para expressar o princípio nas palavras
de Beck sobre a Constituição - 231 "sempre que ao povo dos Estados Unidos
repugna uma disposição de lei autorizadamente interpretada pela Corte Suprema,
muitas vezes uma nova lei se estabelece, por meio de emenda à Constituição.
Assim as Emendas 11 e 16 proveram novas leis, pondo de lado outras disposições
declaradas constitucionais pela Corte Suprema".
A comparação referida foi reforçada pela pretensão de que as idéias
de governo popular provinham da Idade Media, através do cardeal Belarmino,
sendo que os escritos de Belarmino, publicados cerca de 1600, teriam diretamente
influenciado os autores da Lei de Direitos, da Virginia, e da Declaração de
Independência. Semelhante suposição, que foi primeiro aventada em 1917, parece
geralmente aceita pela igreja católica, americana, que a tem como bem fundamentada.
Repetem-na os católicos eruditos do mais alto renome, julgando-a fato histórico,
e os prelados da mais elevada eminência tem-na apresentado a auditórios populares.
Ensinam-na em escolas paroquiais e reproduzem-na em jornais católicos romanos,
de modo que a população católica romana está sendo educada na crença ilusória
de que nossas liberdades civis tiveram suas raízes na exposição do cardeal
Belarmino e são herança da Idade Média. A verdadeira linha de sucessão, através
das lutas inglesas e dos publicistas ingleses, assim como a História Colonial
Americana se ignoram, e são como se nunca tivessem existido. Segundo a nova
teoria, Jefferson se inspirou no Cardeal Belarmino e se tornou, por assim
dizer, o expositor do cardeal Belarmino nas praias do Ocidente.
O elemento imaginário da teoria e quase tão proeminente como o foi
na criação das pseudo-decretais Isidoriânas, aceitas como fato por mais de
seis séculos. Tão intensamente têm aprofundado raízes a lenda Belarmino-Jefferson
sobre a origem da Declaração, que colaboradores da Revista Católica de
História - outubro de 1924 e janeiro de 1925 - sentem-se à vontade para
asseverar que "a contribuição de Belarmino a democracia é atestada pelos
princípios enunciados pelo cardeal, que foram incorporados na Declaração de
Independência", e "os novos princípios de governo popular e democráticos
foram defendidos pelo cardeal, há 300 anos". Um colaborador de América,
- 19 de maio de 1923 - diz que a democracia tem no cardeal "um dos mais
claros e mais lógicos expositores e os americanos têm toda razão para honrar
seus escritos, como uma das fontes de que Jefferson, que os conhecia através
de notas recolhidas de outros escritores, derivou alguns dos princípios fundamentais
da Declaração de Independência".
As considerações que tornam mui improvável que Mr. Jefferson deva
alguma coisa ao cardeal Belarmino, por suas idéias democráticas de governo,
são as seguintes: 1) Em parte alguma de seus escritos Jefferson menciona o
cardeal Belarmino, exceto uma vez, em 1823, registrando uma lista de escritores
que lhe fornecera Madison. A Explicação dada por alguns escritores católicos
romanos a ausência de citação de Belarmino, é a de que teria sido perigoso
a um americano apelar para a autoridade de um cardeal católico romano, evasiva
em nada lisonjeira à independência e à coragem de Jefferson. 2) Jefferson
se referiu expressamente, em seus escritos, às doutrinas de Sidney e Locke
- especialmente Locke - assim como a Aristóteles, Cícero e outros que escreveram
sobre política e governo. 3) A biblioteca de Jefferson continha numerosas
obras sobre política e governo, incluíndo, além dos autores que acabamos de
mencionar, Platão, Calvino, Bodin, a Política Eclesikstica, de Hooker, a Utópia
de More, Harrington Buchanan, Escritos em Prosa de Milton e outros volumes
e panfletos. Os escritos de Belarmino não figuravam entre eles. 4) As lutas
pelas liberdades inglesas e os direitos coloniais eram mais familiares a Jefferson
do que o e a guerra civil à presente geração de cidadãos americanos. As palavras
pacto, ajuste, consentimento dos governados, empregadas para definir a relação
existente entre o povo e seus magistrados tem uma venerável tradição protestante,
remontando a épocas em que o cardeal Belarmino longe estava de nascer. 5)
Acima de tudo, se Mr. Jefferson tivesse mantido relações com Belarmino, teria
encontrado no cardeal um conceito de governo diferente do que expressou na
Declaração de Independência. Tivesse sido o cardeal acompanhado e aquele documento
não teria inculcado o direito de o povo americano resistir a monarquia, que
o mesmo cardeal ensinou ser a forma divinamente estabelecida de governo: o
cardeal efetivamente ensinou que, de todas as formas, a pior - deterrimum
- é uma democracia; o povo não goza de poder político até que - donec
- tenha conferido autoridade a um príncipe. Quando dizia que "todos os
homens nasceram livres" nascuntur omnes naturaliter liberi - referia-se
as origens do governo, conforme foram expostas por Aristóteles. Ele não disse
que "todos os homens nascem livres e iguais", como um colaborador
da Revista Católica de História - janeiro de 1925, p. 513 assevera,
passando depois a acrescentar que "daí, da definição de Belarmino, a
Declaração de Independência derivou aquela expressão". Em parte alguma
dos três capítulos de sua grande obra sobre governo se pode encontrar uma
expressão semelhante à definição contida na Declaração: "todos os homens
são criados iguais; são dotados por seu Criador de certos direitos inalienáveis,
sendo que entre estes estão a vida, a liberdade e a procura da felicidade;
que para assegurar esses direitos e que os governos são instituídos entre
os homens, derivando seus poderes exatamente do consentimento dos governados".
Onde se poderiam encontrar, nas obras de Belarmino, as provisões
da Constituição para a liberdade religiosa e para a separação entre a Igreja
e o Estado, se a autoridade do cardeal houvesse sido seguida? Um escritor
- o padre J. H. McMahon, insistiu, através do Nova York Independente,
de 20 de novembro de 1920, em que "a doutrina puritana da separação entre
a Igreja e o Estado é a preparação lógica para o Bolchevismo. Nosso propósito
é desfazer o efeito da -idéia puritana que contaminou o pais". O cardeal
Hayes, de Nova York, estava enganado, quando recomendou como verdadeira a
lenda Belarmino-Jefferson, em discurso pronunciado em Detroit, a 18 de outubro
de 1927, perante o Concílio Nacional de Homens Católicos. Segundo o Catholic
News, o cardeal "salientou que a Lei de Direitos, da Virginia, foi
tirada quase palavra por palavra dos escritos do venerável Roberto Belarmino,
o fiél conselheiro de quatro papas"; mais adiante disse que "é com
grande orgulho que, como católicos, podemos recordar que os princípios, quase
a própria linguagem de nossa Declaração de Independência, foram escritos pelo
venerável Belarmino - agora em vias de canonização - com aprovação do santo
Padre, mais de um século antes que a Declaração anunciasse ao mundo um novo
regime de liberdade".
Quando Richard Henry Lee chegou a pretender que a Declaração de
Independência fora copiada do Tratado sobre o Governo de Locke, Jefferson,
então já bem avançado em anos, replicou que "toda a autoridade da Declaração
repousava na harmonização dos sentimentos contemporâneos, expressos em conversação,
cartas, ensaios impressos ou nos livros elementares de Direito Público, como
se verifica na obra de Aristóteles, Cícero, Locke, Sidney, etc." João
Adams, escrevendo em 25 de novembro de 1821, formulou seu testemunho, ao dizer
que "a dívida da humanidade para com Locke, pela difusão dos princípios
da liberdade civil e religiosa, estão além de minha capacidade de calcular".
Retrocedendo mais, Adams em outra ocasião dissera que o tratado de Ponet sobre
Politike Power, publicado em 1556, muito antes que Belarmino escrevesse,
continha todos os princípios essenciais de governo, que foram mais tarde ampliados
por Sidney e Locke".
Falando das nações que durante a recente guerra (1914-18), tinham
"reatado amigáveis relações com a Santa Sé ou iniciado tais relações",
Pio XI apontou, em 1922, para a Idade Média, que forneceu o exemplo da verdadeira
sociedade de nações e um período em que a santidade da lei era observada e
o pontífice era reconhecido como "a sede de uma soberania de administração
divina, que transcende aos confins de todos os povos e nações e abraça a todos
os povos e nações". A França, a Grã-bretanha e a Rússia tinham-se comprometido,
por tratado secreto, a não admitirem representantes papais, "para tentarem
quaisquer expedientes diplomáticos no tocante a regularização de questões
ligadas a presente guerra". Entretanto, a pressão do Vaticano para que
tivesse representação junto a Liga das Nações foi sustentada até 1926, época
em que o Concílio Católico sobre Relações Internacionais, reunido em Londres,
clamou por aquela representação, em virtude da "influencia sem par e
do poder mundial da Santa Sé".
A pretensão do pontífice romano, de possuir uma superintendência
que se estende a todos os negócios universais, foi revelada no quadro que
representa a Paz de Veneza, de 1177, e se encontrava ainda exposto no Vaticano
há poucos anos, provavelmente la estando ainda. A pintura, que e cópia do
quadro mural de Veneza, exibe a humilhação de Frederico Barbarroxa diante
de Alexandre III. O imperador está prostrado diante do pontífice, revestido
este de paramentos pontificais e ostentando uma coroa, e apóia os pés sobre
o ombro direito do imperador. Na pintura estão gravadas as palavras do Salmo
91: "Calcarás o Leão e a serpente". Enquanto a teoria do poder que
os pontífices reclamaram, por aproximadamente dez séculos, permanecer sem
desmentido por porte de um de seus sucessores, continuará a incerteza no tocante
a política que o Vaticano possa seguir, em possível momento de crise nacional,
e sobre a atitude que os cidadãos americanos possam ser chamados a assumir,
no que respeita ao "Santo Padre", como vice-gerente de Deus na terra
e a cujo aceno, segundo a bula de Bonifácio unam sanctam - os governadores
da terra devem desembainhar a espada. O cardeal Manning louvava a Lord Denbigh,
por "ser primeiro católico e depois inglês". Se as palavras significam
que, em matéria de consciência, deve ser prestada obediência a Deus acima
do Estado, os católicos não merecem crítica; mas se as palavras querem significar
que, em negócios como o da separação entre a Igreja e o Estado, o homem religioso
tem o direito de resistir, com fundamentos de ordem eclesiástica, as palavras
do cardeal são inconsistentes com a lealdade americana à Constituição. Ao
tempo da "Armada", os católicos ingleses se recusaram a seguir ao
papa e dar apoio a Filipe II. Eles sustentaram o governo inglês .
Somente use Bíblias traduzidas do Texto Tradicional (aquele perfeitamente preservado por Deus em ininterrupto uso por fieis): BKJ-1611 ou LTT (Bíblia Literal do Texto Tradicional, com notas para estudo) na bvloja.com.br. Ou ACF, da SBTB.