15 agosto 2006
Em seu leito de morte, William Carey solicitou a Alexandre Duff (1806-1878),
missionário escocês na Índia: “Quando eu me for, não diga nada acerca do Dr.
Carey. Fale acerca do Salvador de Dr. Carey”. Duff atendeu apenas à segunda
parte do pedido, assim como muitos após ele.
Filho primogênito de Edmund Carey (m.
1816) e Elizabeth Wells (m. 1787), William Carey nasceu em uma humilde cabana
em 17 de agosto de 1761, na pequena vila de Paulerspury, em Northamptonshire,
na Inglaterra. Em toda a sua vida, sempre lutou com dificuldades de todo
gênero, porém jamais se deixando vencer por elas. Seus companheiros diziam
dele: “O que Carey começa, sempre termina”. Quando ainda menino, Carey subiu
numa árvore para observar um ninho de pássaros. Escorregou e caiu. Com algumas
contusões e arranhões, voltou para casa; sua mãe tratou de aplicar-lhe os
curativos e colocou-o na cama. Entretanto, sua mãe logo notou a ausência do
menino e, quando viu, lá vinha ele chegando com o ninho de pássaros na mão. O
menino Carey tinha Cristóvão Colombo (1451-1506) como seu herói favorito, a
ponto de receber o apelido de “Colombo”. Amava a natureza, colecionava e
estudava pássaros, insetos e plantas que encontrava nos campos. Acima de tudo,
porém, amava os livros, especialmente os que falavam de viagens e aventuras. Em
Piddington, aos quatorze anos, William aprendeu o ofício de sapateiro.
Apesar de nascer em um lar anglicano, sua primeira identificação com a fé genuína
foi através de seu companheiro de trabalho, John Warr, filho de um desertor da
Igreja Estatal. Em 1779, aos 18 anos, quando ainda estava identificado com a
igreja oficial da Inglaterra, experimentou o novo nascimento, passando a
freqüentar uma pequena igreja batista. Logo começou a se preparar para pregar.
Acumulou muitos conhecimentos, tornando-se poliglota; dominou o latim, grego,
hebraico, italiano, francês e holandês, além de diversas ciências. A fim de
estudar hebraico caminhava catorze quilômetros para se encontrar com o
professor. Assim, aos poucos, entendeu que o mundo era bem maior do que as
Ilhas Britânicas e sentiu, como todo o crente verdadeiro deve sentir, a
perdição de uma humanidade sem um Salvador.
Em junho de 1781, casou-se com a jovem Dorothy Plackett (1756-1807), com a qual
teve sete filhos (Ann, Felix, William Jr., Peter, Lucy, Jabez,
e Jonathan), e com quem permaneceu casado por vinte e seis anos.
Charlotte Von Rumohr (1761-1821), a quem Carey conheceu em Serampore,
Índia, foi sua segunda esposa, e com quem conviveu por treze anos numa união
muito feliz. Sua vida muito espiritual e intelectual foi de grande
encorajamento e ajuda para Carey em seu trabalho. Grace Hughes (1777-1835) foi
sua terceira esposa; era uma viúva de quarenta e cinco anos quando se casaram,
e, como uma devotada companheira, cuidou de Carey durante os seus últimos onze
anos. Grace teve uma filha de seu primeiro casamento.
No ano de 1775, Carey foi grandemente impactado pelo avivamento liderado pelos
também britânicos John Wesley (1703-1791) e George Whitefield (1714-1770).
Apesar de ter sido batizado quando criança, William Carey sentiu a necessidade
de confessar sua fé publicamente. Sendo assim, foi batizado nas águas do
rio Nene, em Northampton, no dia 5 de outubro de 1783, pelo pastor John Ryland
Jr. (1753-1825), que se tornou um grande amigo e apoiador da obra missionária
que Carey veio a realizar. Em 1787, William Carey foi consagrado e começou a
pregar sobre a necessidade missionária no mundo, e não só na Inglaterra. Como
os membros de sua congregação eram pobres, provendo-lhe o módico ordenado de 15
libras anuais, Carey teve por necessidade continuar trabalhando para ganhar o
seu sustento. Costumava dizer: “Meu negócio é estender o Reino de Cristo.
Fabrico e remendo sapatos unicamente para ajudar a cobrir minhas despesas”. O
Sr. Robert Hall (1728-1791), pastor em Arnesby, Leicestershire, foi um dos
mentores de Carey no ministério. A Associação Batista de Northamptonshire fora
fundada em 1765.
Na sua pequena oficina Carey pendurou um mapa-múndi feito pelas suas próprias
mãos. Neste mapa, ele incluiu todas as informações disponíveis: população,
flora, fauna, características do povo, etc. Enquanto trabalhava, olhava para
ele, orava, sonhava e agia! Foi assim que sentiu mais e mais a chamada de Deus
em sua vida. Quando quis introduzir o assunto de missões na associação local de
pastores, Carey teria sido repreendido pelo reverenciado presidente John Collett
Ryland (1723-1792), pastor batista em Northampton, o qual teria rebatido seu
desejo de enviar missionários para terras remotas. Mas Carey continuou a sua
propaganda pró-missões estrangeiras, e tomando Isaías 54.2 como texto, pregava
sobre o tema: "Esperai grandes coisas de Deus; praticai proezas para
Deus."
O resultado foi que um grupo de doze pastores batistas, reunidos na casa de
Sra. Beeby Wallis, formaram a Baptist Missionary Society (Sociedade
Missionária Batista), no dia 2 de outubro de 1792. Originalmente, o nome da organização era Particular Baptist Society
for the Propagation of the Gospel Amongst the Heathen (Sociedade Batista
Particular para a Propagação do Evangelho entre os Pagãos). Carey se ofereceu
para ser o primeiro missionário. Através do testemunho do Dr. John Thomas
(1757-1800), um missionário e médico que trabalhou por vários anos em Bengali,
na Índia, William Carey recebeu confirmação de sua chamada no dia 10 de janeiro
de 1793. Andrew Fuller (1754-1815), pastor batista em Kettering, tornou-se o
principal teólogo do movimento missionário, aliando a profunda teologia da
escola calvinista de Jonathan Edwards (1703-1758) com um fervoroso zelo
missionário e uma ação pastoral prática e piedosa. Homens como os pastores
batistas Samuel Pearce (1766-1799) e John Sutcliff (1752-1814), e John Newton
(1725-1807), o conhecido clérigo anglicano e escritor de hinos, foram grandes
encorajadores da obra missionária que ele se propôs a realizar.
Apesar de Carey ter certeza de sua chamada, sua esposa recusou-se a deixar a
Inglaterra. Isto muito doeu em seu coração. Foi decidido, no entanto, que seu
filho mais velho, Felix, o acompanharia à India. Além deste fator, outro
problema que parecia insolúvel era a proibição de qualquer missionário na
Índia. Sob tais circunstâncias era inútil pedir licença para entrar, mas mesmo
assim, conseguiram embarcar sem o documento no dia 4 de abril de 1793. Ao
esperar na Ilha de Wight por outro navio que os levaria à Índia, o comandante recusou levá-los sem a permissão
necessária. Com lágrimas nos olhos e o coração apertado, William Carey viu o
navio partir e ele ficar. Sua jornada missionária para Índia parecia terminar
ali. Porém, Deus, que tem todas as coisas sob controle, tinha outro propósito.
Ao regressar à Londres, a Sociedade Missionária conseguiu reunir recursos e
comprar as passagens em um navio dinamarquês. Uma vez mais, Carey rogou à sua
esposa que o acompanhasse. Ela ainda persistia na recusa, e ao despedir-se pela
segunda vez disse: "Se eu possuísse o mundo inteiro, daria alegremente
tudo pelo privilégio de levar-te e os nossos filhos comigo; mas o sentido do
meu dever sobrepuja todas as outras considerações. Não posso voltar atrás sem
incorrer em culpa para minha alma." Ao se preparar para partir, um dos
amigos que iria viajar com Carey, Dr. Thomas, voltou e conversou com Dorothy,
esposa de William Carey, e, como que por um milagre, ela decidiu acompanhá-lo.
Foi uma imensa alegria para ele, quando viu sua esposa e filhos com as malas
prontas a lhe acompanhar! Agora ele compreendia a razão de não haver viajado no
primeiro navio. O comandante do navio comoveu-se a ponto de permitir que a
família viajasse sem pagar as passagens. Finalmente, no dia 13 de junho de 1793,
a bordo do navio Kron Princesa Maria, William Carey, com trinta e três anos,
deixou a Inglaterra e nunca mais voltou, partindo para a Índia com sua família,
onde, em condições dificílimas e de oposição, trabalhou durante quarenta e um
anos. Durante sua viagem, aprendeu suficiente o Bengali, e ao desembarcar, já
comunicava com o povo.
Alguns biógrafos dizem que William Carey “não foi dotado de inteligência
superior e nem de qualquer dom que deslumbrasse os homens”. Entretanto, todos
identificam “seu caráter perseverante, com espírito indômito e inconquistável,
que completava tudo quanto iniciava”. O fato, porém, é que apesar de não haver
recebido educação formal em sua mocidade, Carey chegou a ser um dos homens mais
eruditos do mundo, no que diz respeito à lingua sânscrito e a outros idiomas
orientais. Distinguiu-se notavelmente no campo da lingüística, e suas
gramáticas e dicionários são usados ainda hoje.
Durante seu primeiro ano na Índia, todos seus familiares adoeceram, um após
outro. Seu filho Peter, de cinco anos, foi vitimado pela febre e morreu. Para
manter-se, Carey trabalhava como gerente de uma fábrica de corante anil.
Decorridos sete anos, o primeiro convertido foi batizado, Krishna Pal (m.
1822), um carpinteiro. Outros missionários se juntaram a Carey. Em 1799,
William Ward (1769-1823) e Joshua Marshman (1768-1837) vieram somar esforços.
Juntos eles fundaram 26 igrejas, 126 escolas com 10.000 alunos, traduziram as
Escrituras em 44 línguas, produziram gramáticas e dicionários, organizaram a
primeira missão médica na Índia, seminários, escola para meninas, e o jornal na
língua Bengali. Além disso, William Carey foi responsável pela erradicação do
costume "suttee", o qual queimava a viúva juntamente com o
corpo do defunto numa fogueira. Foi também responsável pela cessação do
sacrifício de crianças, que eram atiradas às águas do rio Ganges. Entre os
efeitos de seu trabalho estão vários experimentos agrícolas; a fundação da
Sociedade de Agricultura e Horticultura na Índia em 1820; a primeira imprensa,
fábrica de papel e motor à vapor na Índia; e a tradução da Bíblia em Sânscrito,
Bengali, Marati, Telegu e nos idiomas dos Sikhs.
Calcula-se que William Carey traduziu a Bíblia para a terça parte dos
habitantes do mundo. Alguns missionários, em 1855, ao apresentarem o Evangelho
no Afeganistão, acharam que a única versão que esse povo entendia era o Pushtoo,
feita em Sarampore por Carey. Durante mais de trinta anos, William Carey foi
professor de línguas orientais no Colégio de Fort Williams. Fundou, também, o Serampore
College para ensinar os obreiros. Sob a sua direção, o colégio prosperou,
preenchendo um grande vácuo na evangelização do país. Os seus esforços,
inspiraram a fundação de outras missões, dentre elas: a Associação Missionária
de Londres, em 1795; a Associação Missionária da Holanda, em 1797; a Associação
Missionária Americana, em 1810; e a União Missionária Batista Americana, em
1814.
Carey morreu aos setenta e três anos, na manhã de 9 de junho de 1834,
respeitado por todo o mundo, e considerado por muitos como “o pai de um grande
movimento missionário”. Seu corpo foi sepultado no “campo missionário”. Ao
chegar à Índia, os ingleses negaram-lhe permissão para desembarcar. William Wilberforce
(1759-1833), o denodado líder do Parlamento (que empenhou-se pelo fim do
tráfico negreiro), defendeu o direito de Carey e outros missionários de levarem
adiante a pregação do Evangelho na índia. Ao morrer Carey, porém, o governo
britânico mandou içar as bandeiras a meia haste em honra de um herói que fizera
mais para a Índia do que todos os generais britânicos.
Carey acreditava que os missionários devem estudar o pano de fundo e a maneira
de pensar dos povos não-cristãos aos quais servem, treinando um ministério
indígena o mais prontamente possível. Assim, quando Carey faleceu, os próprios
crentes indianos puderam dar continuação à obra, pois havia uma liderança
formada.
Para uma breve biografia em Língua Inglesa, recomendo a que foi escrita pelo
Dr. Michael Haykin, online, “A Wretched, poor, and Helpless Worm”: The
Life and Legacy of William Carey (1761-1834)”. Para uma
biografia em Português, recomendo o livro de Dr. Timothy George, Fiel
Testemunha; Vida e Obra de William Carey, publicado por Edições Vida Nova. Para
uma leitura acerca dos amigos de Carey, bem como o cenário batista em sua
época, recomendo o livro de Dr. Haykin, One Heart and One Soul; John Sutcliff
of Olney, his friends and his times, publicado por Evangelical
Press. O maior acervo online acerca
de William Carey encontra-se no Center for Study of the Life and Work of William Carey. Outras informações online em: http://www.wholesomewords.org/biography/biorpcarey.html.
Cronologia:
1761 |
Nasce na Inglaterra, na pequena vila de Paulerspury, em Northamptonshire, no mês de agosto. Era de família pobre, seus pais eram os anglicanos: Edmund e Elizabeth Carey. |
1775 |
Aos 14 anos aprende a profissão de sapateiro, que iria exercer durante boa parte de sua vida. |
1775 |
As mensagens de avivamento de John Wesley e George Whitefield atingem o coração do adolescente William Carey. |
1779 |
Aos 18 anos ocorre sua conversão, quando passa a freqüentar uma pequena igreja batista da Inglaterra. |
1779 |
Logo após sua conversão, passa a dedicar-se aos estudos, aprendendo diversas ciências e idiomas, como o latim, o grego, o hebraico, o italiano, o francês e o holandês. |
1781 |
Casa-se com a jovem Dorothy Placket, com quem teve os seus filhos. |
1783 |
É batizado pelo pastor John Ryland, no dia 5 de outubro. |
1787 |
Foi consagrado e começou a pregar sobre a necessidade missionária em todo o mundo. |
1787 |
Continuou trabalhando como sapateiro, pois os membros de sua igreja dispunham de poucos recursos financeiros. Colocou um mapa-múndi na sua sapataria, onde sempre orava pela evangelização mundial. |
1792 |
Funda a Sociedade Missionária Batista. |
1793 |
No dia 13 de junho embarca no navio Kron princess Mary para a Índia e nunca mais volta para a Inglaterra. Durante a viagem, aprendeu o bengali, dialeto local da Índia, chegando ao país já evangelizando a população. |
1801 |
Publica o Novo Testamento em bengali (idioma indiano). |
1834 |
Morre aos 73 anos. Pelo que se tem registro, Carey foi o 1° missionário a batizar um hindu convertido à fé cristã. Foi também professor de milhares de seminarista indianos e ajudou a fundar muitas escolas e seminários teológicos. Por dados estatísticos, estima-se que tenha traduzido a Bíblia para a terça parte do mundo |
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