O Espiritismo tem usado alguns textos bíblicos sobre João Batista e Elias,
para justificar a tese da reencarnação. Vejam o que diz:
“Se o princípio da reencarnação, conforme se acha expresso em S. João,
podia, a rigor, ser interpretado em sentido puramente místico, o mesmo já não
acontece com esta passagem de S. Mateus, que não permite equívoco: ele mesmo
é o Elias que há de vir. Não há aí figura, nem alegoria; é uma afirmação
positiva” (O Evangelho Segundo o Espiritismo, Allan Kardec, 90a edição, pg
91).
Os textos
“Eu vos enviarei o profeta Elias, antes que venha o dia grande e terrível
do Senhor” (Ml 4.5).
“E, se quiserdes dar crédito, ele é o Elias que havia de vir” (Mt
11.14).
“Os discípulos O interrogavam: Por que dizem, pois, os escribas que é
mister que Elias venha primeiro? Jesus lhe respondeu: Certamente Elias virá
primeiro, e restaurará todas as coisas. Mas digo-vos que Elias já veio, e não
o conheceram, mas fizeram-lhe tudo o que quiseram. Assim, farão eles também
padecer o Filho do homem. Então entenderam os discípulos que lhes falara a
respeito de João Batista”. (Mt 17.10-13).
“Pois [João Batista] será grande diante do Senhor...será cheio do Espírito
Santo, já desde o ventre de sua mãe; e converterá muitos dos filhos de
Israel ao Senhor seu Deus. Irá adiante dele no espírito e poder de Elias,
para converter os corações dos pais aos filhos...” (Lc 1.15-17).
Exame
Primeiro - De maneira alguma se lê em Lucas 1.15-17 que João Batista seria
uma reencarnação de Elias. Não se encontra nessa passagem qualquer respaldo
à falsa tese reencarnacionista, que nunca pôde ser provada, exceto pelas
falas dos próprios “espíritos”. Nem direta, nem indiretamente, o anjo
Gabriel declara que Elias reencarnaria em João, mas que este teria virtudes
idênticas às daquele: “No espírito e na virtude de Elias”;
desenvolveria um ministério muito semelhante ao de Elias em termos de garra,
ousadia, consagração, unção e sofrimento. Comparemos: semelhança no início
de seus ministérios (1 Rs 17.1 – Mt 3.1); Elias repreendeu a Acabe (1 Rs
18.17-18); João, a Herodes (Mt 14.3-4); Elias foi perseguido por Jezabel (1
Rs 19.2-3); João Batista, por Herodias (Mt 14.6-8); os dois viviam de forma
austera e discreta.
Segundo - Quando Jesus falou “Elias já veio” (Mt 17.12) e “ele é o
Elias que havia de vir” (Mt 11.14), estava em suma dizendo que Elias não
ressuscitara como todos esperavam, mas que João Batista desempenhara o papel
de precursor do Messias com a mesma coragem, virtude e espírito de Elias. Com
estas palavras, Jesus confirmava Lucas 1.17. Situação parecida vamos
encontrar em 1 Reis 2.15: “O espírito de Elias repousa sobre Eliseu”.
Esta declaração foi proferida pouco tempo depois de Elias ter sido
arrebatado ao céu num redemoinho (v.11). Pode-se interpretar de forma literal
essa passagem? Não. Não se tratava de reencarnação porque Eliseu já possuía
o seu “desencarnado” nele encarnado, se fosse o caso. Os dois viveram numa
mesma época. Um não podia ser encarnação do outro; não se trata de
possessão mediúnica, ou seja, Eliseu não havia incorporado o espírito de
Elias, por óbvias e irrefutáveis razões. É importante observar que os discípulos
interpretaram muito bem as afirmações de Jesus, pois “entenderam que lhes
falara a respeito de João Batista” (Mt 17.13). Ou seja: entenderam
corretamente que Elias não veio; que quem estava ali não era Elias, mas o próprio
João Batista.
Terceiro - Ainda em nossos dias usamos esse estilo de expressão: “Nunca
mais surgirá um Rui Barbosa”. “O Ronaldinho é um verdadeiro Pelé”;
“Quando surgirá um Mané Garrincha?”. São termos comparativos. [Se
acreditais na vinda de um Elias], “e, se quiserdes dar crédito, ele é o
Elias que havia de vir” (Mt 11.14). Por suas mensagens vibrantes e seu
corajoso desempenho diante de situações difíceis, Elias tornou-se símbolo
dos profetas. Moisés, por exemplo, era símbolo da Lei (Lc 16.31). As
profecias sobre a vinda de Elias não se contradizem. Muito pelo contrário.
Vejam: Malaquias 4.5: “Eis que eu vos envio o profeta Elias, antes que venha
o dia grande e terrível do Senhor; e converterei o coração dos pais aos
filhos e o coração dos filhos a seus pais; para que eu não venha e fira a
terra com maldição”. Lucas 1.15-17: “Porque será grande diante do
Senhor, e não beberá vinho, nem bebida forte, e será cheio do Espírito
Santo, já desde o ventre de sua mãe. E converterá muitos dos filhos de
Israel ao Senhor, seu Deus. E irá adiante dele no espírito e virtude de
Elias, para converter o coração dos pais aos filhos e os rebeldes, à prudência
dos justos, com o fim de preparar ao Senhor um povo bem disposto”. João
Batista seria semelhante em muitos aspectos ao destemido profeta Elias. Logo,
as profecias da vinda de Elias se cumpriram em João Batista. Portanto, Elias
veio representado, não encarnado, na pessoa de João, o Batista (Mt 11.14 e
17.10-13).
Quarto - O francês Hippolyte Leon Denizart Rivail soube ser ele a reencarnação
dum poeta celta chamado Allan Kardec. Ora, se a crença da reencarnação
fosse assim tão difundida e aceita; se Jesus fosse um médium; se vivessem os
apóstolos nesse clima de experiências espirituais, João Batista, como
aconteceu com Kardec, seria o primeiro a saber que ele não era ele mesmo. Mas
vejam:
“Perguntaram-lhe [a João Batista]: Então quem és? És tu Elias? Ele
disse: Não sou. És tu o profeta? Não”. E como insistissem para saber quem
ele era, respondeu com as palavras do profeta Isaías: “Eu sou a voz do que
clama no deserto. Endireitai o caminho do Senhor. Perguntaram-lhe. Então por
que batizas, se não és o Cristo, nem Elias, nem o profeta? João respondeu:
Eu batizo com água, mas no meio de vós está alguém que não conheceis.
Este é aquele que vem após mim, do qual eu não sou digno de desatar as
correias das sandálias” (Jo 1.21-27).
João responde aos que procuram apoio bíblico para a tese da reencarnação:
EU NÃO SOU ELIAS. João era bastante sincero e firme em suas declarações.
Se ele realmente tivesse dúvidas ou não soubesse, certamente responderia: Eu
não sei se sou Elias. Ora, um profeta que anuncia a vinda de um Salvador até
então desconhecido (“alguém que não conheceis”); que teve a humildade
de sair de cena no momento em que Jesus iniciou seu ministério (Jo 3.30); que
conhecia a missão que lhe fora confiada, a de preparar os corações para
receber as Boas Novas (Is 40.3); um profeta cheio do Espírito Santo (Lc
1.15); que recebeu público reconhecimento de Jesus (Mt 11.11), um profeta
assim só poderia responder com absoluta convicção. Devemos crer nas suas
palavras, ou seja, que ele não era nem nunca foi Elias.
Quinto – Por ocasião da transfiguração de Jesus, quando apareceram Moisés
e Elias (Mt 17.3) João Batista já havia morrido, pois fora decapitado por
ordem de Herodes (Mt 14.10). Ora, João era quem deveria aparecer ali, e não
Elias, segundo a tese reencarnacionista. Na questão 150 do Livro dos Espíritos
lê-se que a alma “tem um fluído que lhe é próprio, colhido na atmosfera
de seu planeta, e que representa a aparência de sua última reencarnação”.
Então, a última aparência daquela alma, que em determinado momento recebeu
um corpo humano e se chamou Elias, seria a de João Batista. O que significa
dizer que, sob o ponto de vista da própria teoria espírita, João Batista
nunca foi Elias reencarnado.
Sexto - A teoria da reencarnação fundamenta-se no ciclo
“morrer-renascer-morrer”, ou seja, sucessivas mortes e sucessivos
renascimentos. No monumento sobre o túmulo de Allan Kardec, no cemitério de
Pére Lachaise, em Paris, está escrito: “Nascer, morrer, renascer ainda é
progredir sempre: esta é a lei”. Leia-se: “A reencarnação é a volta da
alma ou Espírito à vida corpórea, mas em outro corpo especialmente formado
para ele e que nada tem de comum com o antigo” (O Evangelho Segundo o
Espiritismo, Allan Kardec, 90a Edição, 1985, p.88). Para um espírito
retornar à vida corpórea é preciso que tenha desencarnado, isto é, que o
corpo haja descido ao pó, exceção somente admitida no caso da primeira
encarnação, no estado em que a alma é “simples e ignorante”, tudo de
acordo a teoria espírita. Como Elias não morreu, mas foi por inteiro
trasladado ao céu (2 Rs 2.11), não há como imaginar que tenha reencarnado
em João Batista. Seria uma tremenda incongruência.
Em Hebreus 9.27 está escrito “E, como aos homens está ordenado morrer uma
só vez, vindo depois disso o juízo...”. Quando a Bíblia fala em
“homem” está se referindo à parte física, o corpo, mais a parte
imaterial, o espírito. Na morte, o espírito separa-se do corpo e fica
aguardando o julgamento divino. O profeta Elias não precisou passar pela
morte. Foi direto para o céu.
Finalmente, entendo que Jesus deu a exata dimensão e interpretação da
profecia de Malaquias 4.5. Confirmando a profecia do anjo – “[João
Batista virá] no espírito e virtude de Elias” -, Jesus declarou que João
Batista representava o Elias que haveria de vir: “É este o Elias que havia
de vir” (Mt 11.14). Isto é, a profecia a respeito da vinda de Elias foi
cumprida na pessoa de João Batista.
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