por
Lee Irons
Embora os excessos “carismáticos” de hoje em dia extrapolam-se
para além da tradicional prática de falar em línguas e descambam-se para os
verdadeiros espetáculos que raiam ao bizarro (haja vista as manifestações
extáticas associadas à Bênção de Toronto), as línguas ainda podem ser
consideradas assunto em pauta, ante a necessidade de esclarecimento acerca da
matéria. Não nos estendemos pelos muitos outros pontos teológicos envolvidos,
como a teologia da segunda bênção, o papel da experiência subjetiva na vida
cristã, e assim por diante.
O que se segue é meramente uma compilação dos melhores argumentos cessacionistas
que demonstram que as línguas e a profecia cessaram com o fim da era
apostólica. De modo algum estes argumentos são originais. Para tanto,
baseamo-nos muito no trabalho de Richard Gaffin em Perspectives on Pentecost
(1979), o qual consideramos o melhor livro sobre o assunto. De fato, muito
do que se segue não passa de simples esboço dos argumentos de Gaffin, citados
por nós de forma completamente livre. Outras fontes são citadas também a título
de corroboração e exposição.
“Cessacionismo”
é aqui definido como a tese de que alguns dons (e seus correspondentes
ministérios) descritos no Novo Testamento são ordinários e perpétuos, enquanto
outros eram extraordinários e foram paulatinamente desaparecendo da vida da
igreja a partir do fim da era apostólica.
DONS ORDINÁRIOS/MINISTÉRIOS:
(para
uma justificação exegética dessa tríplice classificação, veja Order in the
Offices, editado por Mark Brown)
1.Pastores
e mestres - Rom. 12:7; Efé. 4:11; I Tim. 3:1-7
2.Presbíteros
(dom de dirigir e governo) - I Cor. 12:28; Rom. 12:8; I Tim. 5:17
3.
Diáconos (dom de serviço, distribuição, misericórdia) - Rom. 12:7-8; I Tim.
3:8-13
1.
Apóstolos
2. Profetas (palavra de sabedoria; de conhecimento - I Cor. 12:8)
3. Evangelistas
4. Discernimento de espíritos (I Cor. 12:10)
5.Línguas
6. Interpretação de línguas
7. Operadores de milagres; curas (“fé” inclusive(?) I Cor. 12:9)
Não
podemos detalhar aqui, mas nos parece razoável presumir que há um
relacionamento íntimo entre dom e ministério. No caso dos dons extraordinários,
é desnecessário presumir que um apóstolo tivesse de impor as mãos sobre cada
pessoa para recebesse um determinado dom extraordinário (apesar de que isso
ocorreu em alguns exemplos - Atos 8:17; 19:6; II Tim. 1:6). Em vez disso, a
outorga de carismas ocorria por ocasião da ordenação.
No
que diz respeito aos dons ordinários, emerge o seguinte quadro. Nas Epistolas
Pastorais (que nos dão uma idéia da ordem a ser perpetuada na igreja após a era
apostólica), vemos as qualificações (I Tim. 3:1-13), o teste probatório (I Tim.
3:10), e a ordenação (I Tim. 5:22; Tit. 1:5) como elementos fixos a ser considerados
no estabelecimento de oficiais ou lideres na igreja, os quais eram dotados de
dons de ensinar (pastor), reger (presbítero) ou exercer misericórdia (diácono).
Além
dos ministérios especiais, há também o ministério geral de todos os crentes
(Efé. 4:11-13). Uma vez que todo o Corpo de Cristo é dotado espiritualmente,
cada um pode (e deve) exercitar o seu, ou os seus, dons, “para a obra do
ministério” e da edificação do corpo, sem ter que necessariamente ser ordenado
a um ministério/oficio especial (Rom. 12:4-8; Efé. 4:16; I Ped. 4:10-11).
A
questão não é se o cessacionista aceita (ou rejeita) a realidade da obra
do Espírito Santo na vida dos crentes.
A
posição cessacionista afirma que todos os crentes possuem “o dom” do
Espírito Santo (Jo. 7:37-39; At. 2:38; I Cor. 12:13). Todos os que são
batizados em Cristo são batizados com o Espírito Santo.
Além
disso, afirma-se que a igreja pós-apostólica continua sendo abençoada
ricamente com várias distribuições do Espírito Santo, (“dons”) para a
edificação do corpo de Cristo através de diversas formas de ministério (I Cor.
12; Efé. 4:11-16). Todo o crente possui tanto “o dom” como “dons”. Nem todos
crentes têm todos os dons, uma vez que estes são distribuídos por Deus conforme
lhe apraz (I Cor. 12).
Sobretudo,
a posição cessacionista não nega o subjetivo, o aspecto experiencial da
vida cristã, que pode ser considerado como um elemento intrínseco do ministério
do Espírito Santo. Tão profunda e misteriosa é a obra do Espírito na vida dos
crentes que chega a ser por vezes indescritível (Rom.
11:33; II Cor. 9:15; 12:4; I Ped. 1:8), ministrando-nos num nível de nosso ser que
suplanta o nosso intelecto. O Espírito ministra a nós ...
·
a ajuda na oração (Rom. 8:26-27; Efé. 6:18; Jud 20)
· o derramamento do amor de Deus em nossos corações. (Rom. 5:5)
· a impressão em nós de um antegozo da glória celeste. (II Cor. 1:21b; Efé.
1:13 e ss.)
· a nossa santificação (I Cor. 6:11; I Ped. 1:2)
· o enchimento de nossos corações com o amor, alegria, paz, esperança etc.
(Rom. 15:13; Gal. 5:22 e ss.)
· o nosso despertamento com poder para a mortificação da carne (Rom. 8:13)
· a testificação em nosso espírito de que somos filhos de Deus (Rom. 8:15b)
Certamente
essa lista é incompleta, e sem dúvida muitos aspectos do ministério do Espírito
Santo, acima descritos, são sobrepostos ou se tornam indistinguíveis
na experiência atual.
Os
cessacionistas afirmam também que, embora todo o verdadeiro filho de
Deus tem o Espírito como um dom permanente (Rom. 8:9), a experiência subjetiva
do crente é variável. Portanto, é possível entristecer e apagar o
Espírito Santo (Efé. 4:30; I Tes. 5:19), e, por isso, somos ordenados a nos enchermos
e andarmos no Espírito (Efé. 5:18; Gal. 5:25).
“As
línguas no NT sempre estavam intimamente associadas à profecia e, quando
interpretadas, eram funcionalmente equivalentes à profecia, como revelação de
Deus para edificar os outros. De fato, as línguas eram uma forma de profecia”
(Gaffin, p. 102)
“Talvez
pudéssemos até falar um certo tipo de línguas essencialmente proféticas, a
diferença é que, ao contrário da profecia, essas línguas requerem interpretação
para serem entendidas pelos outros” (Gaffin, p. 80)
1.
“Um deliberado contraste entre profecia e línguas estrutura todo o capitulo.
Este par de dons percorre segue uma linha mestra em quase todo o contexto... O
que estrutura I Coríntios 14 é a junção da profecia com as línguas, o que leva
a concluir que de fato ambos, justapostos, são dons da palavra revelatória.”
(Gaffin, pp. 56, 81). “O que liga profecia às línguas, o que ambas têm em comum
é o que as fazem comparáveis (contrastáveis) e explicam suas equivalências
funcionais, sendo isso o que determina que elas são o dom da palavra.” (Gaffin,
p. 58)
2.
A possibilidade de interpretação das línguas indica (I Cor 12:10, 30; 14:5, 13,
26-28) que é uma comunicação inteligível de Deus. Conseqüentemente,
deve ser uma revelação divina. (Este ponto é válido ainda que as línguas em Corinto
fossem línguas atualmente existentes.)
3.
“Conforme I Cor. 14:5 (“o que profetiza é maior do que o que fala em línguas, a
não ser que também interprete”), as línguas interpretadas são funcionalmente
equivalentes à profecia. (Robertson, p. 27) “A inferioridade fundamental ou a
depreciação das línguas em relação à profecia aparentemente aplica-se somente
às línguas não interpretadas e é removida quando ocorre interpretação.”
(Gaffin, p. 57)
4.
“O caráter revelacional e inspiratório das línguas é também visto no fato de
que pelo Espírito 'quem fala em línguas... fala mistério' (I Cor.
14:2).” Compare-se com I Cor. 13:2. (Gaffin, p. 79) “Este termo 'mysterion',
no NT, tem um verdadeiro significado específico que inerentemente evoca a idéia
de comunicação da revelação divina.” (Robertson, p. 23)
5.
“Em Atos, encontramos indicações de uma associação definida entre profecia e
línguas.” Atos 2:4 (cf. vv. 17-18, citando Joel 2:28 em diante); 19:6 (“eles
falaram em línguas e profetizaram”). (Gaffin, pp. 81-82)
6.
Exegese cuidadosa de I Cor. 14:14 (veja 2. abaixo) conduz a seguinte tradução:
“Porque se eu oro em línguas, o Espírito em mim [ou, o espírito que me foi
dado] ora, mas o meu intelecto fica inativo.” (NEB)
[Hélio
não recomenda esta bíblia]. Desse modo, alguém que fala em
línguas fala palavras inspiradas pelo Espírito Santo, o que é a definição de
profecia. Cf. v. 2. (Gaffin, pp. 73-78)
O
fato das Escrituras mencionarem outros usos secundários das línguas não
prejudica o seu caráter intrínseco fundamentalmente profético e revelacional.
Os três argumentos seguintes têm sido utilizados para relevar os usos
secundários do dom de línguas e dessa maneira minimizar ou eliminar o seu
elemento profético/revelacional.
“Em
I Corinthians 14 Paulo diz que 'alguém que fala em línguas não fala aos homens,
mas a Deus' (v. 2) e as línguas redundam em 'oração,' 'cânticos,' e 'ações de
graças' a Deus (vv. 14-17). Um argumento por vezes contrário a natureza
revelacional das línguas em Corinto e que é mais uma direção divina das línguas
e menos, ou nada a ver, com uma direção à revelação.”
Resposta:
“Em contraposição... quando nos debruçamos sobre os Salmos e outras porções
doxológicas da Escritura. Caso recitemos algum salmo que é dirigido a
Deus e não aos homens, por essa razão então não seria revelação? Em sentido
contrário, sob a direção divina é revelação inspirada e registrada na
Escritura para que pudesse servir para edificação do seu povo da aliança, e é
isso o que as línguas (interpretadas) também são e para isso que elas também
serviriam (v. 5).” (Gaffin, p. 80)
I
Cor. 14:14 [Hélio mudou todas as citações para a única Bíblia
que recomenda, a ACF] diz: “Porque, se eu orar em língua
desconhecida, o meu espírito ora bem, mas o meu entendimento fica sem fruto.”
(1Co 14:14 ACF) Alega-se que este texto ensina que há
uma função não-revelacional para as línguas, ou seja, é uma expressão das
profundezas do espírito do crente, sub-racional e não-conceitual.
Resposta:
Esta visão precisa tomar a expressão “meu espírito” como uma referência ao
espírito humano, e deve empregá-la em contraste com a “minha mente”. Mas isso é
exegeticamente indefensável pelas seguintes razões:
·
A antropologia do NT nunca coloca o “espírito” e a “mente” humanas uma contra a
outra assim desse jeito. O único dualismo que a escritura aceita é entre o
corpo e o espírito/mente/coração/alma, ou entre “o homem exterior” e “o homem
interior.” O fato de Paulo poder falar em “renovar no espírito da vossa mente”
(Efé. 4:23), mostra que “espírito” e “mente” pertence ao mesmo domínio
semântico. Cf. também Marcos 12:30. (Gaffin, pp.
74f )
·
A palavra “espírito” em I Cor. 14:14 não deveria ser interpretada
antropologicamente (como um componente da psicologia humana) mas
carismaticamente (como uma referencia ao dom dado a cada profeta pelo Espírito
Santo). Este é um uso estabelecido: “o que fala em língua... (pelo) em (seu)
espírito fala mistérios” (v. 2); “já que estais desejosos de dons espirituais,”
(lit. “espíritos,” v. 12); “os espíritos dos profetas são sujeito aos profetas”
(v. 32); “a outros, o dom de discernir os espíritos” (I Cor. 12:10);
“Amados, não
creiais a todo o espírito, mas provai se os espíritos são de Deus, porque já
muitos falsos profetas se têm levantado no mundo.” (1Jo 4:1 ACF);
“o Deus dos espíritos dos profetas” (Apo. 22:6).
I
Cor. 14:4 nos diz que “quem fala em línguas edifica-se a si mesmo.” Usualmente,
este verso está mencionado em conexão com uma interpretação antropológica de
“espírito” nos vv. 2 e 14 (que examinamos acima e deixa muito a desejar). O
argumento é que, embora as línguas precisem ser traduzidas, se exercitadas em
publico, elas ainda são espiritualmente benéficas ao individuo que as usa
privadamente (“Mas, se não houver intérprete, esteja calado na igreja, e fale
consigo mesmo, e com Deus.” v. 28).
Resposta
A: “Qualquer uso privado das línguas, separadas, acrescidas, ou independentes
do seu exercício publico, ligado à interpretação, certo modo, descaracteriza o
dom. É como se dissesse que há um dom de línguas para o uso privado, e outro
para o uso público (com interpretação). No entanto, particularmente, qualquer
utilização privada das línguas evoca um aspecto estritamente subsidiário,
periférico do dom. As línguas privadas são vistas
como adjuntos benéficos, subsidiários, desfrutados pelo recipiente do dom (a
ser interpretado) que tem função revelacional distintiva. Note-se
que estão debaixo das reiteradas ordens de Paulo justamente os que oravam e
louvavam em línguas (v. 14b), no sentido de que houvesse interpretação (v. 13;
cf. v. 5), os quais freqüentemente entendiam como central o exercício privado
do dom. Da visão que sustenta que as línguas foram primeiramente dadas para a
vida de oração pessoal do crente, e não para exercitá-las publicamente na
congregação, distanciadas da interpretação, pode-se dizer apenas que isso
inverte complemente o ponto de vista focalizado por Paulo em I Coríntios 14” .
(Gaffin, p. 83)
Resposta
B: É precisamente este aspecto não-intelectual, sub-racional do falar
inspirado, extático que fazia tão atrativo o dom de línguas aos cristãos imaturos
do Corinto. E é justamente este aspecto que Paulo quer controlar, limitar, e
minimizar. É verdade que não proíbe que se falem em línguas (de fato, ele
proíbe que seja proibido - 14:39). Mas ele reprova os coríntios por suas
prioridades imaturas (14:20), visto que eles exaltavam a expressão extática
acima do o falar inteligível, edificante (profecia, interpretação de línguas).
Paulo permite o dom extático, obviamente, porque ele era um dom
genuíno do Espírito para aquele tempo, mas ele solicita que este dom seja
exercido em determinada forma, precisamente por causa dos abusos que poderiam
surgir devido seu elemento necessariamente não-racional, extático. Ele o limita
de três maneiras:
·
Como a profecia, as línguas estão sujeitas à avaliação e ao discernimento dos
seus conteúdos pelos companheiros-profetas existentes na igreja reunida (I Cor.
12:10; 14:29). Todas supostamente inspiradas, as expressões extáticas precisam
ser julgadas para ver se elas estão “de acordo com a analogia da fé” (Rom. 12:6
- para exegese veja Gillespie, cap. 1). “não desprezeis as profecias; mas ponde
tudo à prova. Retende o que é bom” (I Tes. 5:20 ss/comp. I Jo. 4:1-3).
De
acordo com Gillespie, os pneumáticos de Corinto aparentemente criam que as
expressões ininteligíveis, extáticas (glossolalia) eram o principal sinal
verificador do falar inelegível autêntico (profecia). “Os que eram infantes
espiritualmente a viam [línguas] com o sine qua non da obra do Espírito,
sem dúvida, como um 'sinal' confirmatório da expressão profética.” (Gillespie,
p. 160)
Mas,
em I Cor. 12:1-3 Paulo contesta essa avaliação simplista e imatura da
importância das línguas. Parafraseando: “Vocês sabem que as evidencias de
êxtase não são critérios confiáveis para apurar a autenticidade da inspiração
divina por que no passado pagão de voes elas os dirigiam aos ídolos mudos (v.
2). Então, a legitimidade das expressões proféticas precisa ser julgada
puramente com base no seu conteúdo material (v. 3).” (Gillespie, p. 83)
·
A segunda limitação é intimamente relacionada à primeira, mas aduz-se outra
dimensão: o falar extático não é evidência suficiente de que alguém está sob
inspiração do Espírito.
De
acordo com a exigência de que as línguas estejam em consonância com o evangelho
ortodoxo, Paulo insiste que elas precisam ser traduzidas de modo a que seu
conteúdo ortodoxo possa edificar o corpo. É claro que a edificação inteligível,
racional, doutrinária é a única justificativa para o exercício das
línguas na assembleia. Se elas não servem para este propósito, elas meramente
enchem de orgulho o possuidor do dom, o que está em oposição ao amor (I Cor.
13).
·
Por fim, argumentar que a utilização privada, auto-edificadora,
não-revelacional das línguas deveria continuar hoje implica em prejudicar a
força do argumento de Paulo em I Cor. 14. Porque é precisamente este elemento
extático, não-racional, que Paulo insiste que deve ser colocado totalmente em
subserviência à função revelacional, pública, verificável e corporativa do dom.
De acordo com Paulo , qualquer beneficio do falar não revelacional e extático
deve ser considerado como secundário, efeito colateral subordinado ao propósito
e função próprios do dom, e então não é algo para ser procurado à parte deste
propósito e função precípuas.
“A
noção de línguas não-revelacionais, como as incontidas vocalizações, se
pré-conceituais, provenientes do lado inconsciente da personalidade ... não é
ensinada em I Corinthians 12-14, ou em qualquer outro lugar do NT.” (Gaffin, p.
81)
1.
O apostolado foi um evento redentivo-histórico irrepetível do mesmo modo que a
morte, sepultamento e ressurreição de Cristo, por que “o anúncio da redenção
não pode ser separado da própria história da redenção.” (Ridderbos, pp. 12-15).
2.
O apostolado foi encerrado depois da chamada de Paulo, uma vez que ele
estabelece que Cristo apareceu-lhe “o último de todos” (I Cor. 15:8 - veja o
detalhamento da exegese em Jones). A Doutrina Católica Romana da sucessão
apostólica não tem fundamentação exegética (Cullmann, pp. 207, 236).
3.
A presença do apostolado era uma condição necessária para a produção das
Escrituras inspiradas do Novo Testamento. “A base redentivo-histórica
do cânon do Novo Testamento somente poderia ser procurada na autoridade apostólica
e tradição.” (Ridderbos, p. 24)
4.
Conseqüentemente, como o apostolado, a escritura do Novo Testamento é um evento
redentivo-histórico irrepetível, único, e completo. “Quando entendido em termos
de história da redenção, o cânon não pode ser aberto; por principio ele precisa
ser fechado. Conseqüência direta da natureza única e exclusiva do poder
dos apóstolos recebido de Cristo... A natureza fechada do cânon do Novo
Testamento permanece no final das contas de significância definitiva, de uma
vez por todas, na própria história da redenção apresentada pelas testemunhas
apostólicas.” (Ridderbos, p. 25)
5.
A partida definitiva do apostolado necessariamente implica no encerramento do
cânon do Novo Testamento.
6.
Para que a profecia (incluindo línguas- veja “pressuposição básica” acima)
pudesse continuar nas gerações subseqüentes pós-apostólicas da igreja, para
além do período fundacional, teria que necessariamente criar tensões com o
caráter fechado, finalizado, do cânon. De fato, do mesmo modo, a continuação
poderia acabar com o cânon em seu sentido estrito. (Gaffin, p. 100).
7.
Conseqüentemente, os dons proféticos (profecia, línguas etc.) tinham que passar
da vida da igreja com o encerramento do cânon do NT.
[“Edificados sobre o fundamento dos apóstolos e dos
profetas, de que Jesus Cristo é a principal pedra da esquina;” (Efésios 2:20
ACF)]
1.
Tecnicamente, este argumento não deve ser separado do precedente. São
fundamentalmente criveis algumas considerações teológicas (a natureza
única e temporária do apostolado). De qualquer forma, é mais pedagogicamente útil
apresentar este argumento separadamente, uma vez está baseado
mais num texto-prova explicito do que numa dedução apenas.
2.
“Texto decisivo, de importância crucial, é Efésios 2:20 (no seu contexto) e
precisa ser apreciado.... I Coríntios 14 ... tem um escopo relativamente
estreito e está confinado à situação especifica de Corinto. O texto de Efésios,
por outro lado, pode ser visto como uma carta circular, pela qual originalmente
Paulo tinha em mente um leque de destinatários mais amplo do que a congregação
de Éfeso. O mais importante ainda é que 2:20 é parte duma seção que analisa a
igreja como um todo de forma mais abrangente e compreensiva. Efésios 2:20
padroniza, vê o edifício inteiro, e situa nesse contexto a profecia (uma parte
das fundações do edifício); I Corinthians e outras passagens sobre profecia
examina antes de tudo uma parte desse todo. Efésios 2:20, então, com seu
escopo amplo tem que ter um papel essencial e dominante na busca do
entendimento de outras menções de profecias no NT que têm foco mais estreito,
mais particular e mais detalhado....” (Gaffin, p. 96)
3.
“Efésios 2:20 associa 'profetas' com os apóstolos em atividade de testemunhas
fundamentais ou de ministros da palavra.” (Gaffin, p. 93)
4.
Esses “profetas” não são os profetas do Antigo Testamento, mas estes são
encontrados em todo o NT (Atos 13:1 em diante; 21:10 e ss.; I Cor. 12:28;
14:1-40; Ef. 4:11; Apo. 1:1-3). O fato de que os profetas do AT não são iguais
aos do NT é demonstrado em Ef. 3:5 que usa a mesma frase “apóstolos e profetas”
em contraste com a revelação no AT.
5.
Um estudioso não-cessacionista admite que a exegese de Gaffin de Efésios 2:20
está correta e pode favorecer a posição cessacionista. No entanto, ele tenta
esquivar-se de focalizar este argumento através da interpretação de que havia
“os apóstolos que eram também profetas” (Grudem, pp. 45-64). Mas essa exegese
não passa pelo crivo de qualquer análise gramatical séria (Wallace), e os
demais argumentos de Grudem tem sido respondidos ponto por ponto (White).
6.
“Línguas estão ligadas à profecia e se mantém, por assim dizer, nas sombras. Há
pelos menos uma sugestão no capítulo [I Cor. 14] de que as línguas não têm
lugar na vida da congregação à parte de sua coexistência, e exercício
conjugado, com a profecia.” (Gaffin, p. 58)
7.
Mesmo que o dom de línguas per se não aparece em Ef. 2:20, a evidência aduzida
no “pressuposto básico” (acima) nos força a concluir que na medida em que as
línguas são interpretadas elas são funcionalmente equivalentes à expressão
profética, e assim pôde participar na aludida fundação da Igreja.
8.
Inerente à analogia da fundação é a idéia de que uma vez que o fundamento foi
lançado , todo o trabalho que resta é edificar sob o fundamento (I Cor.
3:10-15). Quando Paulo identifica os apóstolos e os novos profetas da aliança
com a fundação da igreja, afirma desse modo seu papel original, não-perpétuo.
9.
Conseqüentemente, o dom de línguas era para a fundação da igreja, e
conseqüentemente nada mais natural que tenham “desaparecido da vida da igreja
juntamente com a profecia e os demais dons fundacionais, ligados à presença do
apostolado na igreja.” (Gaffin, p. 102).
1.
Paulo declara que as línguas como línguas (isto é, à parte do conteúdo
revelacional, quando interpretadas) foram dadas como um sinal de juízo de Deus
contra os descrentes (I Cor. 14:20-22).
2.
De maneira análoga às parábolas de Jesus (Marcos 4:12), as línguas foram dadas
primariamente (mas não exclusivamente) para endurecer Israel na incredulidade.
Essa função “está ligada inseparavelmente à transição definitiva da velha para
a nova e final história da aliança, uma transição que resulta na fundação da
igreja.” (Gaffin, p. 107)
3.
A citação por Paulo de Isaias 28:11-12, característico da utilização do AT no
NT, evoca intencionalmente o contexto mais amplo de Isaias 28, particularmente,
o v. 16 (“Portanto assim diz o Senhor DEUS: Eis
que eu assentei em Sião uma pedra, uma pedra já provada, pedra preciosa de
esquina, que está bem firme e fundada; aquele que crer não se apresse.” (Is
28:16 ACF) .
“No
NT este versículo é proeminente nas passagens relativas à edificação da Igreja;
é mencionado em I Pedro 2:6 (cf. v. 4) e evidentemente se baseia no que se
encontra em Efésios 2:20 (cf. I Cor. 3:11). Cristo como o fundamento da Igreja
é o cumprimento desta profecia. Mas é também citado em Romanos 9:33 (cf.
10:11), onde é aplicado contra o Israel infiel a Cristo e ao Evangelho (cf.
9:31 e ss.). O julgamento sobre Judá foi predito por Isaias, inclusive por meio
da manifestação das línguas estranhas enviadas por Deus, o que foi cumprido
mediante o lançamento do alicerce da Igreja em Cristo e nos apóstolos (e
profetas). O tempo de Deus (de uma vez por todas) lançar um firme fundamento em
Sião é também o tempo de conclusão do julgamento dos infiéis em Sião provocado
por essa atividade.” (Gaffin, p. 108)
4.
“Dentro deste amplo contexto de profecia e cumprimento, pois, o ponto que Paulo
salienta em I Coríntios 14:21 e ss. é que as línguas são sinal de juízo de Deus
ocorrido durante a inauguração da nova aliança e a fundação da Igreja. Línguas
são o sinal de julgamento correlato ao ocorrido em outras
oportunidades (lançar fundamentos), relativo às ações divinas (primariamente no
contexto judaico) contra os infiéis e o julgamento escatológico
que o acompanha.”
5.
Apesar de não podermos restringir as línguas como um sinal exclusivamente aos
judeus infiéis (uma vez que I Cor. 14:22 o aplica a todos os descrentes),
continua sendo verdade isso especificamente em relação aos judeus infiéis, o
que conduz à ab-rogação da antiga ordem da aliança e o lançamento das bases
para uma nova aliança. Além disso, vemos em Atos 18:1-17 que a oposição judaica
à missão gentílica era muito forte em Corinto.
6.
“Não pode ser negligenciado que, seja qual for significância das línguas como
um sinal, Paulo ensina claramente que essa função de sinal é uma característica
integral das línguas, presente sempre quando o dom é exercitado.” (Gaffin, p. 109)
7.
Então, visto que as línguas são um sinal pertencente ao período de transição na
história da redenção, quando o antigo Israel estava sendo rejeitado e o novo
Israel estava sendo instaurado, hoje elas não são mais necessárias.
[...]
FONTES
CITADAS
BROWN,
Mark R., ed. Order in the Offices: Essays
Defining the Roles of Church Officers.
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CULLMANN, Oscar. Peter: Disciple, Apostle,
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GRUDEM, W. A. The Gift of Profecy in the New
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Fonte:
Jornal Os Puritanos.
Só use as duas Bíblias traduzidas rigorosamente por equivalência formal a partir do Textus Receptus (que é a exata impressão das palavras perfeitamente inspiradas e preservadas por Deus), dignas herdeiras das KJB-1611, Almeida-1681, etc.: a ACF-2011 (Almeida Corrigida Fiel) e a LTT (Literal do Texto Tradicional), que v. pode ler e obter em BibliaLTT.org, com ou sem notas).
Somente use Bíblias traduzidas do Texto Tradicional (aquele perfeitamente preservado por Deus em ininterrupto uso por fieis): BKJ-1611 ou LTT (Bíblia Literal do Texto Tradicional, com notas para estudo) na bvloja.com.br. Ou ACF, da SBTB.