Alcoolismo
O álcool é uma palavra de origem árabe que significa sutil. E, realmente não
há nada mais sutil do que ele. Abocanha suas vítimas como uma cobra que
rasteja lentamente, escondida no mato. Ninguém inicia no vício, embriagando-se
na primeira vez. Aumenta-se pouco a pouco as doses, até que a vítima seja
completamente dominada.
A bebida não encontra fronteiras. Freqüenta todos os lugares sem qualquer
inibição. Não só se faz presente nas recepções presidenciais e nas mais
altas cortes das nações, como também na confraria dos miseráveis mendigos
debaixo da ponte.
Desinibe o artista que sobe no palco, traz coragem ao bandido que sai para
roubar e entorpece o pecador que não consegue dormir. Quando está frio, se
bebe para esquentar. Se está calor, uma geladinha para refrescar. Se há
tristeza, bebe-se para esquecer. Se há alegria, se enche a cara para celebrar.
Seja nascimento, batizado, aniversário ou funeral, não há ocasião em que o
sutil deixe de encontrar espaço para se achegar.
O sutil é também um rei impiedoso que governa seus lacaios com mão de
ferro. Exige fidelidade absoluta. Por amor a ele, seus servos abandonam suas famílias,
entregam tudo que têm e deixam até de comer. E assim, após tirar-lhes tudo, o
cruel soberano os torna fracos e doentes, levando-os à morte lentamente.
Seja da cana ou da cevada, o sutil é obtido quando os excrementos de minúsculas
bactérias azedam o caldo, causando assim sua fermentação. Não é errado
dizer que este rei vem das fezes e em fezes torna a vida daqueles que lhe
servem.
Mesmo sabendo disto, os homens mentem e escondem o caráter maligno e
destruidor desse soberano. Se assim não fosse, toda garrafa sutil traria em seu
rótulo: “Esta embalagem contém acidentes de automóvel, desemprego, miséria,
vícios, doenças, separação do casal, destruição familiar, torpor, perda de
memória, traições, imoralidades, crimes, incêndios, vícios e vergonhas. O
uso contínuo fatalmente o fará dependente e louco.”
Bem, mas vamos à lenda que dá título a esta coluna.
Conta-se que há muitos e muitos anos um homem, desejoso de enriquecer, fez
um pacto com o maligno. Este o instruiu a plantar um grande canavial e regá-lo
com o sangue de três animais: o porco, o macaco e o leão.
Por ocasião da colheita, o homem teve um sonho, no qual aprendeu a preparar
a bebida que lhe daria a fortuna que ambicionava. Assim nascia a cachaça. No
princípio, a dava gratuitamente para quem quisesse dela provar. E logo suas vítimas
voltavam para comprar mais daquela inebriante mistura.
Fez clientes entre ricos e pobres. À sua porta batiam tanto o doutor como o
mendigo. Fosse sol ou fosse chuva, nunca lhe faltavam os infelizes a estender as
notas em busca da bebida.
Em pouco tempo, o homem se tornou muito rico. Seus negócios se espalharam
por todo o canto. Crescia sua riqueza na mesma proporção que crescia a miséria
dos que lhe batiam à porta.
Ao se entregarem ao vício, os beberrões manifestavam a conduta de um dos três
animais, cujo o sangue havia regado a terra. Uns bebiam até cair, passando as
noites nas ruas imundas, perdendo completamente o asseio e o zelo. Tornaram-se
relaxados sem qualquer apreço pela própria aparência. Era o sangue do porco.
Outros, passavam a rir descontroladamente e a causar também riso nos que os
viam. Sem qualquer senso e com a cara deformada pelo álcool, articulavam
palavras desconexas, passo trôpegos e caretas ridículas, sem firmeza sequer
para segurar o copo que lhes embriagava. Por onde passavam eram zombados e até
as crianças lhes chamavam por nomes e apelidos. Era o sangue do macaco.
Outros finalmente, tornavam-se valentes, violentos e sanguinários. Aos
primeiros goles da bebida, subia-lhes à mente um ódio selvagem que explodia
sem qualquer razão ou motivo. Começavam brigas no bar e terminavam espancando
suas esposas e filhos ao chegarem de madrugada em casa. Era o sangue do leão.
Assim é o álcool. Ninguém cometeu mais crimes do que o sutil. Ninguém
continua tão impune quanto ele.
Diz a Palavra do Senhor: “Ai dos que levantam pela manhã, e seguem a
bebedice, e continuam até alta noite, até que o vinho os esquenta. Liras e
harpas, tamboris e flautas, e vinho há nos seus banquetes, porém não
consideram os feitos do Senhor nem olham para as obras de suas mãos” Isaías
5.11-12.
Copiado de Banco Teológico
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